terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Túmulo de D. Pedro I – II



Na cabeceira do seu túmulo e em contraponto com o Calvário esculpido no monumento de D. Inês, D. Pedro mandou esculpir uma dupla roda, tratada à maneira de rosácea gótica, uma Roda da Vida e uma Roda da Fortuna, em que cada uma das rodas tem a sua estrutura narrativa própria. A narrativa central desenrola-se ao longo de seis pétalas, evoca a vida comum de Pedro e Inês, aproximando-se da Roda da Fortuna.
Esta rosácea assim trabalhada e aplicada num túmulo é um caso único em toda a tumulária portuguesa ou europeia. Não se conhece outra igual.
 Como existem várias interpretações para a leitura destas Rodas, principalmente para a inscrição final, aqui deixo estas.



A Roda da Vida possui 12 edículas com os momentos da vida amorosa e trágica de D. Pedro e de D. Inês. Na leitura das edículas (feita no sentido ascendente e da esquerda para a direita), podemos observar: D. Inês acaricia um dos filhos; o casal convive com os três filhos; D. Inês e D. Pedro jogam xadrez; os dois amantes mostram-se em terno convívio; D. Inês subjuga uma figura prostrada no chão; D. Pedro sentado num grandioso trono; D. Inês apanhada de surpresa pelos assassinos enviados pelo rei D. Afonso IV; D. Inês desmascarando um dos seus assassinos; degolação de D. Inês; D. Inês já morta; castigo dos assassinos de Inês; D. Pedro I envolto numa mortalha.





Nas edículas interiores – Roda da Fortuna – podemos observar (no mesmo sentido da Roda da Vida): D. Inês sentada à esquerda de D. Pedro (por ainda não estarem casados); o casal troca de posição (D. Inês sentada à direita de D. Pedro, o que indica que já estão casados); D. Pedro e D. Inês sentados lado a lado parecendo um retrato oficial; D. Afonso IV a expulsar (pelo apontar do dedo) Inês do reino; D. Inês repele um homem que parece ser de novo D. Afonso IV; D. Pedro e D. Inês prostrados no chão subjugados pela figura híbrida da Fortuna que segura com as mãos a roda.
Na parte inferior da rosácea, e no pequeno túmulo com uma estátua jacente – certamente a de D. Pedro –está gravado: ATÉ A FIM DO MUNDO.
Reynaldo dos Santos (1924), tem uma outra interpretação: Ele nota a presença de Adão e Eva na parte superior, fora da rosácea. As figuras foram mutiladas, mas é inegável a sua interpretação. Quanto à rosácea, trata-se de uma Roda da Fortuna, tema iconográfico tradicional. Os vários registos da rosácea representam cenas da vida humana, desde a educação na meninice até à morte, com as suas lutas e seus combates. Colocada no túmulo do rei, esta Roda da Fortuna opor-se-ia ao Juízo Final esculpido no de D. Inês. A inscrição “A : E : AFIN : DOMUNDO” ler-se-ia assim: A(lpha) E A FIN DO MUNDO. “O começo (alpha) e o fim do mundo”, interpretação que estaria confirmada pela presença de Adão e Eva. O pequeno jacente colocado por debaixo da inscrição representaria o homem esperando a ressurreição.
Por sua vez, António de Vasconcelos (1928), leu a inscrição assim: A(qui) E(spero) A FIN DO MUNDO, “Aqui espero pelo fim do Mundo”.
Frei Fortunato de São Boaventura (1827) lera assim este texto enigmático: Este he o fim do mundo, leitura que corrigiu depois para: Esta he a fin do mundo, (Este é o fim do mundo).
A 1 de Agosto de 1569, o rei D. Sebastião mandou abrir os túmulos. O de D. Inês foi danificado no tampo pelos operários. Nesta ocasião o rei referiu-se a D. Pedro, censurando abertamente o seu amor por D. Inês. Um dos monges que presenciavam a cena, Frei Francisco Machado, não hesitou em repreender o soberano. “Para satisfazer ao Senhor D. Sebastião o castigou o Cardeal-Infante D. Henrique publicamente, e em particular o louvou e agradeceu a sua rezolução.” Martinho da Fonseca (1924).
Durante a invasão francesa, em 1810, os soldados violaram os túmulos, causando danos irreparáveis no lado direito do de D. Pedro. O corpo do rei estava mumificado e revestido de um manto púrpura.
Fontes e Imagens:

Os Túmulos de D. Pedro e de Dª Inês em Alcobaça, por José Custódio Vieira da Silva.
Alcobaça – Dom Maur Cocheril
Iconografia dos Túmulos de D. Pedro e D. Inês – Manuel Vieira Natividade
Expressões artísticas do Universo Medieval – Maria José Goulão



segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Túmulo de D. Pedro I - I



O túmulo de D. Pedro, assente sobre o dorso de oito leões de juba encaracolada, tem como decoração, alinhados no rebordo da tampa sobre um friso arquitectónico os escudos de Portugal. O jacente do rei apresenta-o ladeado por seis anjos, cujas vestes se desdobram em pregas miúdas. A sua cabeça coroada repousa sobre uma almofada dupla, mas ao contrário da de D. Inês, não está protegida por um baldaquino. O seu rosto é o de um homem maduro, de olhos abertos, com a barba e o cabelo encaracolados. O monarca segura a espada estirada obliquamente sobre o seu corpo, segurando o punho com a mão direita enquanto a esquerda segura a bainha. O corpo apresenta-se com trajes compridos que, à semelhança do moimento de Inês de Castro, se apresentam com notável modelado. Os seus pés estão apoiados num imponente lebréu, embora haja vestígios de um outro. Em termos escultóricos, o túmulo de D. Pedro é considerado uma melhor obra, chegando os altos-relevos a atingir 15cm de profundidade, enquanto no túmulo de D. Inês atingem os 10cm.



Nos frontais da arca, as grandes edículas laterais são preenchidas com passagens da vida de S. Bartolomeu, desde o seu nascimento até à conversão do rei da Arménia, no lado direito, e no frontal esquerdo desenrolam-se os episódios do combate à idolatria e o julgamento e martírio do santo às ordens do rei Astiages, que o condena a ser esfolado vivo. Santo protector do rei, vela pelas crianças epilécticas ou que nasciam com defeitos na fala, como era o caso de D. Pedro.

Martírio de S. Bento (Na última edícula o Santo já com a pele às costas, eleva-se para o Céu mas ainda pregando a dois anciães)



No facial dos pés da arca, está representada a Boa Morte cristã de D. Pedro, dividida em dois momentos, a Extrema-Unção e o Viático. Qualquer das cenas é passada no quarto de dormir do rei, apresentando-se este coroado, deitado num leito gótico. A figura central no nicho que divide as imagens será S. Bento. Estas cenas da morte exemplar do rei remetem-nos para o túmulo de D. Inês, cuja morte violenta a impediu de receber os últimos sacramentos.