(De H. Heine)
Jazia o filho no leito,
A mãe olhava o balcão.
— «Não te levantas, meu filho,
Para ver a procissão?»
— «Ai, mãe! se estou tão doente,
Que não posso ouvir nem ver!
Penso nela... a pobre morta...
Como não hei-de eu sofrer!»
— «Ergue-te, filho, e à romagem
Iremos juntos a orar,
Que aos corações doloridos
Sabe a Virgem consolar.»
Já se ouvem os sacros hinos,
Da cruz flutua o pendão;
Em Colônia sobre o Reno
Vai passando a procissão.
E a mãe e o filho acompanham
A turba que segue o andor,
Dizendo em coro com ela:
-“Glória a ti. Mãe do Senhor!”.
II
Como a Senhora está linda
Com o seu mais rico vestir!
Correm-lhe em chusma os doentes
Muito tem ela que ouvir!
Todos lhe trazem promessas
Com ferventes devoções;
Membros, pés e mãos de cera,
Jazem no altar aos montões.
Quem lhe der um pé de cera,
Logo do pé sarará;
Quem mãos de cera lhe ofereça,
A mão curada verá.
Mancos, que à romagem foram,
Vêem-se na corda saltar;
Outros de mãos aleijadas,
Destros agora a tocar.
Da alva cera duma vela
Fez a mãe um coração.
— «Leva isto à Virgem Maria,
Que te cure essa paixão.»
Gemendo, o filho a recebe,
Gemendo a vai ofertar;
Dos olhos lhe brota o pranto
Do coração este orar:
— «Ó Maria gloriosa!
Serva pura e mãe de Deus:
Virgem, dos Céus Soberana,
Escuta os lamentos meus!
«Em Colônia, onde as igrejas
Se podem contar às cem,
Os meus dias descuidado
Passava com minha mãe.
«E junto de nós vivia
Margarida... a que morreu...
Dou-te um coração de cera,
Cura as feridas do meu!
«Cura minh'alma dorida,
Que eu com devoto fervor
Direi de dia e de noite:
— «Glória a ti. Mãe do Senhor!»
III
Alta noite, adormecidos
Jaziam o filho e a mãe,
E a Virgem mui de mansinho
Entrando no quarto vem...
Pendida sobre o doente
No peito a mão lhe pousou,
E com gesto suavíssimo
Sorrindo se retirou.
Como se através dum sonho,
Tudo isto a mãe percebeu
E acordando alvoroçada,
Junto do filho correu.
Estendido sobre o leito,
Morto, a triste o foi achar;
Andava-lhe a luz da aurora
Pelas faces a brincar.
Vendo-o assim, a mãe piedosa
Juntou as mãos com fervor
E em voz baixa disse, orando:
— «Glória a ti, Mãe do Senhor!»
Abril
de 1864
Júlio
Dinis – Poesias
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