quinta-feira, 25 de abril de 2013

GUERNICA

Segunda-feira, 26 de Abril de 1937, dia de mercado na cidade basca de Guernica.
A vida decorre normalmente para os seus cerca de 7.000 habitantes, embora agora acrescidos de tropas lealistas e de civis que retiravam frente ao avanço das tropas nacionalistas, quando às 16,30h a paz desse dia foi subitamente interrompida pelo ruído das explosões das bombas largadas pelas vagas sucessivas dos aviões Heinkel 111, dirigidos pelos pilotos alemães da Legião Condor, enviados por Hitler para apoiar o general Francisco Franco, durante a Guerra Civil Espanhola. A seguir aos Heinkel 111, vieram os Junker 52, metralhando sem piedade os civis indefesos.
Quando tudo terminou, ao fim de quatro horas de bombardeamento, a maior parte da cidade estava destruída ou em chamas, cerca de 1654 dos seus habitantes estavam mortos e quase outros 1000 feridos, embora estudos actuais baixem bastante estas cifras. 70% dos edifícios ficaram destruídos e 20% seriamente danificados.
Assim começou e terminou o massacre de Guernica, que ficou para a história como o primeiro bombardeamento aéreo sobre civis de que há memória!
O mais trágico de tudo isto é que Guernica não se encontrava directamente na frente de batalha, nem tinha qualquer interesse militar, serviu apenas para testar o efeito dos bombardeamentos sobre as populações civis, e como um aviso do general Franco à autonomia demonstrada pelo governo basco…
Dois dias depois as forças de terra nacionalistas ocuparam a cidade e queimaram todos os arquivos que encontraram na igreja, tornando impossível a contagem final dos mortos.
Provavelmente este episódio nunca ficaria tão conhecido internacionalmente, se nessa noite não estivessem em Bilbau quatro jornalistas profissionais, todos eles estrangeiros: George Lowther Steer, do "The Times", Noel Monks, do "The Daily Express", Christopher Holme, da agência Reuters, todos de Londres, e Mathieu Corman, correspondente do "Ce Soir", de Paris, que ao saberem do sucedido, se deslocaram a Guernica.
 Escreveu George Steer:” Às duas horas da manhã de hoje, quando visitei a cidade, o seu conjunto apresentava uma visão aterradora, ardendo de ponta a ponta. O reflexo das chamas podia ser visto nas nuvens de fumaça acima das montanhas a dez quilómetros de distância. Durante toda a noite caíam casas e as ruas tornavam-se longas pilhas de destroços vermelhos impenetráveis. Muitos dos sobreviventes civis iniciaram a longa caminhada de Guernica a Bilbau em antigas e sólidas carroças bascas puxadas por bois. As carroças repletas de todo o tipo de utensílios domésticos, obstruiram as estradas durante toda a noite. Outros sobreviventes foram evacuados em camiões do Governo, mas muitos foram forçados a permanecer nas redondezas da cidade incendiada deitados em colchões ou procurando parentes e crianças perdidas, enquanto unidades dos bombeiros e da polícia basca motorizada, sob orientação pessoal do ministro do Interior, senhor Monzon e sua esposa, continuavam o trabalho de resgate até o amanhecer".
Embora todo o mundo se sentisse indignado, não houve reacções ao sucedido, e durante décadas assistiu-se a discussões infindáveis sobre os motivos do bombardeamento e quem seriam os verdadeiros responsáveis, e só em 1975 foi oficialmente reconhecido que Guernica tinha sido bombardeada pelos aviões da Legião Condor.
Em 1997 por ocasião do 60º aniversário do ataque, o então Presidente da República Federal Alemã, Roman Herzog, em carta lida pelo embaixador alemão em Espanha pediu publicamente desculpa pela manifesta autoria alemã do bombardeamento.
Guernica tornou-se não só um símbolo dos horrores da guerra, mas também uma antevisão do que iria acontecer mais tarde a cidades como Londres, Berlim, Varsóvia, Tóquio…
Esta atrocidade encheu de indignação o pintor espanhol Pablo Picasso, na altura a residir em Paris, levando-o a pintar o seu famoso mural “Guernica” obra-prima da pintura universal, para ser exposto no pavilhão da Republica Espanhola durante a Exposição Internacional de Paris de 1937, como um autêntico libelo contra a violência e sofrimento infligidas a vitimas inocentes.
www.expresso.pt

domingo, 14 de abril de 2013

O Papa Formoso – III



O Sínodo do Cadáver

Em Janeiro de 897, o cadáver do Papa Formoso exumado nove meses após a sua morte, vestido e adornado com as vestes e símbolos papais e sentado no trono da Basílica de S. João de Latrão, é apresentado perante o sínodo convocado para o seu julgamento. Um diácono a seu lado responde por ele (???) às acusações que lhe são feitas por Estêvão VI, o seu sucessor.
As acusações são várias, mas incidem principalmente no facto de Formoso na sua ambição pelo poder, ter abandonado a sede do seu bispado do Porto para ocupar a cadeira de S. Pedro…
Considerado culpado, todos os actos e decisões tomados durante o seu pontificado foram anulados, e o cadáver depois de despojado das suas ricas vestes, foi mutilado, tendo-lhe sido cortados os três dedos da mão direita usados para a bênção.
Para maior descrédito, o corpo foi enterrado num cemitério para estrangeiros sendo daí retirado dois dias depois e arrojado ao rio Tibre.
O espetáculo macabro fez a opinião pública em Roma voltar-se contra Estêvão, começando a circular rumores de que o corpo de Formoso tinha começado a operar milagres. A revolta do público levou Estêvão a ser deposto e encarcerado, sendo estrangulado em julho ou agosto de 897.
Em novembro desse ano o Papa Teodoro II (897) convocou um sínodo que anulou o Sínodo do Cadáver, reabilitou Formoso, e ordenou que seu corpo, que havia sido recuperado do Tibre, fosse enterrado na Basílica de São Pedro em paramentos pontifícios. Em 898, João IX (898-900) também anulou o Sínodo do Cadáver, e convocou dois sínodos (um em Roma e outro em Ravena), que confirmaram as conclusões do Sínodo de Teodoro II,e ordenou que a acta do Sínodo do Cadáver fosse destruída, proibindo qualquer julgamento futuro de uma pessoa morta.
Após a sua morte, o Papa Sérgio III (904-911), um bispo que tomou parte no Sínodo do Cadáver como co-juiz, anulou as decisões de Teodoro II e João IX, reafirmando a condenação de Formoso, cujos ossos foram novamente atirados ao rio, donde foram recuperados por um monge, ou por um pescador e guardados secretamente até depois da morte de Sérgio III para serem depositados de novo na cripta papal.

Fontes:
pt.wikipédia.org
Cawthorne, Nigel – A Vida Sexual dos Papas
Pierrard, Pierre – História da Igreja Católica
ec.aciprensa.com/wiki

Imagens: wikipédia

terça-feira, 9 de abril de 2013

O Papa Formoso – II

Estêvão VI


Com a deposição do titular da coroa imperial Carlos, O Gordo, em 887 por incapacidade frente aos ataques dos Normandos e à anarquia reinante, pelo então papa Estêvão V, começou para o Ocidente o chamado “século de ferro, o saeculum obscurum”.
A sociedade feudal torna-se mais densa e ramifica-se, agravando a secularização dos bens da Igreja e o domínio das grandes casas feudais sobre as eleições episcopais e sobre os mosteiros, tornados herança de famílias; em Roma chegam a tornar-se donas do trono pontifício.
Por essa altura, Guido de Spoleto, que descendia em linha recta de Carlos Magno pela linha feminina, havia sido nomeado rei de Itália e exercendo uma forte pressão sobre o papado, foi coroado imperador pelo papa Estêvão V.
Em 892, depois da sua eleição, Formoso teve de ratificar essa coroação, nomeando também o filho e herdeiro de Guido como co-imperador. Quando o rei de Itália morre em 894, o trono passa para o seu filho Lamberto, que por ser ainda de menor idade, é à sua mãe, a duquesa Agiltrude, de quem se dizia ser muito bela e com uma figura impressionante, que cabe a regência.
Para aliviar a pressão a que estava sujeito, Formoso pede auxílio ao imperador Arnulfo da Germânia, um dos vencedores dos normandos, filho bastardo de Carlomano da Baviera, oferecendo-lhe a coroa imperial. A duquesa e o filho são obrigados a abandonar Roma e a refugiarem-se em Spoletto e Arnulfo é nomeado rei de Itália e coroado imperador do Sacro Império Romano-Germânico. Mas o imperador ao dirigir-se para Spoletto é atacado por uma súbita enfermidade que o obriga a voltar ao seu país, pelo que a campanha não chega ao fim. Por sua vez, Formoso morre subitamente a 4 de Abril de 896, provavelmente de um ataque de coração.
É enterrado com todas as honras papais em Roma, e é substituído por Bonifácio VI, que morre ao fim de 15 dias, talvez envenenado a mando da duquesa Agiltrude, que entretanto tomara novamente posse de Roma, e nomeara Estêvão VI como Papa.
Este, coroa Lamberto como Imperador do Sacro Império e a terrível duquesa decidida a vingar-se de Formoso, sugeriu o seu julgamento póstumo a Estêvão, dando assim início a um episódio atroz que se tornou numa das páginas mais negras da História da Igreja…


quinta-feira, 4 de abril de 2013

O Papa Formoso - I

Papa Formoso


A 4 de Abril de 896 morre em Roma, de ataque de coração ou envenenado, o 111º Papa da Igreja Católica Romana, eleito para o cargo a 6 de Outubro de 891 com o nome de Formoso.
Primeiro e único de seu nome, provavelmente teria ficado conhecido apenas como o principal responsável pela conversão dos búlgaros, se um acontecimento absolutamente inédito e degradante lhe não tivesse assegurado um lugar especial em toda a longa história dos Papas de Roma: um julgamento póstumo conhecido como o Sínodo do Cadáver.
Nascido em Óstia, Itália, em 816?, a sua vida decorre num período particularmente difícil para uma Igreja em plena degradação, onde os Papas e Anti-Papas se sucedem, e as guerras entre os diversos herdeiros do império Carolíngio assim como as invasões sarracenas põem tudo a ferro e fogo, ameaçando até mesmo a cidade de Roma, sede do Papado.
Nomeado cardeal-bispo do Porto (arredores de Roma) pelo Papa Nicolau I (858-867), foi por este enviado em 866 como legado papal para a corte do Rei Borgoris da Bulgária, onde se desempenhou tão bem do seu cargo, que o monarca pediu a nomeação de Formoso como arcebispo da Bulgária, tanto a Nicolau I como ao seu sucessor Adriano II (867-872), o que ambos os Papas recusaram porque os cânones da Igreja não permitiam que um bispo deixasse a sua sede para governar outra.
De volta a Roma, é envolvido nas querelas do divórcio do rei Lotário, casado com Theutberga, que ao sentir-se repudiada a favor de uma rival, Waldrada, apela à intervenção do Papa. Intervém também nos conflictos que opõem os novos estados da França, Itália e Alemanha e em 872, por morte de Adriano II, concorre sem sucesso à cadeira de S. Pedro, mas é João VIII (872-882) que toma o anel do Pescador.
Apesar disso, o novo Papa mantém a confiança em Formoso e dado que o Imperador Luís II morreu sem descendência, envia-o ao rei de França Carlos, o Calvo, com o convite para que este se descole a Roma a fim de receber a coroa imperial, o que acontece no ano de 875. O novo imperador nomeia os duques Lamberto e Guido de Spolleto como defensores do Papa contra as invasões sarracenas.
Mas a escolha papal é contestada não só pelos outros pretendentes como também por membros da Igreja, e Formoso juntamente com os outros prelados, foge de Roma incorrendo na ira de João VIII, que o excomunga e demite dos cargos.
Em 882, com a morte deste Papa, o seu sucessor Marinho I (882-884), levanta-lhe a excomunhão, chama-o a Roma e em 883 devolve-lhe a diocese do Porto. Depois dos reinados de Adriano III (884-885) e Estevão V (885-891), Formoso é finalmente eleito Papa no ano de 891.