quinta-feira, 31 de março de 2011

Goya - II

A condessa de Chinchón


Cerca de 1798 e a pedido de Manuel Godoy, primeiro-ministro espanhol, pinta o seu célebre quadro “A Maja Desnuda” retratando possivelmente a amante deste, Pepita Tudo, uma bonita actriz, o que lhe trará mais tarde problemas com a Inquisição, que o considerou imoral e obsceno. O tema da nudez não era bem aceite por uma sociedade extremamente conservadora como a da Espanha, naquela altura, e levá-lo-á mais tarde a responder perante a Inquisição (1815).

Os seus retratos deste período mostram, todavia, a sua fascinação pelas mulheres e pelas crianças, não igualada por nenhum outro artista, com a possível excepção de Renoir. Dois retratos de mulheres, executados nessa época, mostram claramente essa qualidade: "Doña Antonia Zarate", orgulhosa, erecta, coquete e algo triste; e a "Condessa de Chinchón", o mais terno dos seus retratos de mulheres.

Datado de 1800, o retrato da Condessa de Chinchón, esposa de Godoy, mostra-a sozinha numa sala, com um vestido branco que acentua a sua expressão inocente e melancólica, espigas de trigo adornando os cabelos como referência à sua próxima maternidade (Maria Teresa encontra-se grávida de cinco meses), numa tela em fundo escuro, sem mais nenhum elemento decorativo, os ombros algo descaídos acentuando a sua fragilidade, e com as mãos como que afagando o ventre que o pintor ilumina com uma luz branca.

Como consequência da Revolução Francesa, Napoleão Bonaparte assume o poder, e a Europa entra em guerra. De 1808 a 1814, Goya assiste aos horrores da Guerra Peninsular, quando as tropas francesas entram em Espanha destituindo o rei e pondo no trono o seu irmão José Bonaparte. Algumas das suas pinturas mais dramáticas, como o “2 de Maio ou A Carga dos Mamelucos” e o célebre “Os Fuzilamentos de 3 de Maio” retratam este período, assim como os da terrível fome que grassou entre 1811 e 1812. É também neste ano que morre a sua esposa Josefa, que sempre o acompanhou. No ano seguinte, a sua governanta, Leocádia Weiss, uma mulher muito mais jovem e bonita, mãe de duas crianças, e de cujo marido se divorciará, dá à luz uma menina, que é geralmente considerada como filha do pintor.

Durante a ocupação francesa pinta também retratos de nobres franceses, incluindo o de José Bonaparte, o que provoca um certo desconforto quando os franceses abandonam Espanha. Trabalha entretanto numa série de 85 estampas que intitula “Os Desastres da Guerra”, onde mostra cenas brutais de uma guerra extremamente violenta e cruel, algumas delas testemunhadas por ele mesmo. Depois da retirada das tropas inimigas, e instalado um governo liberal que tenta várias reformas, entre elas a da Igreja, pinta uma série de desenhos e gravuras retratando os vícios do clero, onde denuncia também os abusos da Inquisição e as torturas praticadas.

Em 1819, já com 73 anos, compra uma casa numa zona rural perto de Madrid, conhecida como a Quinta del Sordo, onde se instala com Leocádia e as crianças, para fugir um pouco ao escândalo desta ligação, contraindo nesse inverno, uma doença que o coloca às portas da morte. É a partir daí, consciente da sua debilidade física, que começa a pintar as paredes da casa com grandes composições a óleo, as famosas “Pinturas Negras”, (assim chamadas por a cor escura ser uma predominante), uma crítica impiedosa e dramática à religião, à velhice, à doença e à morte, assim com à instabilidade política vivida nesse período em Espanha, e que serão passadas para a tela em 1873, já depois do falecimento do pintor. É também nesta altura que se estreia na litografia, fazendo mais tarde uma série intitulada “Os Touros de Bordéus”, que são publicadas em 1825.

No seu regresso ao trono, o rei de Espanha, Fernando VII, institui um regime absolutista, e Goya com receio que os seus quadros o pudessem incriminar, pede em 1823 licença ao rei para se deslocar a França, a fim de se poder tratar, o que lhe é concedido. Desloca-se para casa de um amigo, em Bordéus, onde fica a residir, voltando a Madrid em 1826, apenas para pedir ao rei que lhe conceda a reforma e o autorize a continuar em França.

Mesmo no seu auto-exílio continua a trabalhar, dedicando-se também à miniatura sobre marfim, pintada a guache. As suas últimas obras são um retrato de José Pio de Molina e a famosa “A Bela Leiteira”, pintadas cerca de 1827. Este quadro pode ser considerado como “o canto do cisne” de um grande artista da beleza feminina. Em 1828, já muito doente, fica sem fala e meio paralisado, falecendo pouco depois, a 15 de Abril, com 82 anos de idade. Ficou sepultado no cemitério de Bordéus, sendo os seus restos mortais transladados para Espanha, para a Capela de Santo António de la Florida, (a pintura da cúpula, Um Milagre de Santo António de Pádua, foi feita por Goya em 1798), constatando-se nessa altura, que a cabeça do pintor não vinha com o corpo.


O sabbath das bruxas

quarta-feira, 30 de março de 2011

GOYA - I

Auto-retrato

A 30 de Março de 1746 nasce em Fuendetodos, perto de Saragoça, Francisco José de Goya e Lucientes, filho de um mestre dourador, que o destino haveria de consagrar como um dos maiores pintores espanhóis de sempre, além de um excelente gravador. “Não há regras na pintura” afirmou Goya num discurso proferido na Real Academia de Belas-Artes, de Madrid, ficando ele próprio conhecido pela diversidade do seu estilo, que tanto influenciou as gerações vindouras.

Precursor do impressionismo, pode chamar-se a Goya, o Pai da Pintura Moderna, dando também o seu contributo para os diversos estilos que se seguirão como o romantismo, o realismo ou até o simbolismo, tanto pela crítica aguda expressa em muitas das suas obras, como pelo tratamento da cor, que ele tanto estudou. Deixou cerca de 500 quadros e murais, centenas de desenhos assim como outras tantas litografias e gravuras, além das tapeçarias que desenhou.

Excelente retratista, durante cerca de quarenta anos foi o pintor principal da Corte, o que lhe permitiu fazer os retratos de três reis sucessivos, assim como das suas famílias e da maior parte da nobreza, mas grande parte dos seus quadros são dedicados a figuras do povo, como toureiros, majos e majas, gente humilde, e cenas populares como festas e arraiais, chamando muitas vezes a atenção para problemas sociais, como o do hospício para doentes mentais retratado na sua obra “O Pátio dos Loucos”, ou a falta de segurança existente tanto nas estradas como nas casas ou no mar, patentes em obras como “Bandidos assaltando uma carruagem”, “O Incêndio” ou “O Naufrágio”.

Em 1792, devido a uma grave doença que contraiu, ficou totalmente surdo, o que aumentou a sua tendência para as cores sombrias e dramáticas, isolando-se numa melancolia amarga. Também a morte de seis dos seus sete filhos, tidos pelo seu casamento em 1773, com Josefa Bayeux, foi um dos grandes desgostos que sofreu. No entanto, a doença tornou-o compreensivo para o sofrimento dos outros, e o seu trabalho encerra um profundo humanismo.

Devido à sua longa vida, atravessa um dos períodos mais conturbados da história da Espanha e da Europa, sendo já um homem maduro quando se dá a tomada da Bastilha, em 1789, dando origem a uma revolução que se alastra por grande parte do continente europeu, no mesmo ano em que Goya é nomeado pintor oficial da Corte. Não se coibindo de retratar a família real espanhola em toda a sua crueza, pinta na sua conhecida obra “A Família de Carlos IV”, o ar decadente e vulgar dos membros da família do monarca, cheios de jóias, tecidos dourados, ostentando as suas medalhas, não se compreendendo como foi bem aceite. Tal como Velazquez, que ele muito admirava, também se auto-retrata nesta obra, ao fundo, à esquerda, embora de uma maneira mais modesta, e prestando com esta tela a sua homenagem ao outro génio da pintura espanhola.

Adepto da corrente iluminista que lutava para tirar o país do atraso e da ignorância em que se encontrava, subjugado por uma nobreza ociosa e por um clero em que a maioria dos padres nem sequer sabia ler, em que a crendice em bruxas e sortilégios andava a par de um fanatismo religioso, grava em 1797 uma série de oitenta estampas satíricas, denominada “Os Caprichos” sob o lema de que “o sonho da razão engendra monstros”, testemunho da visão lúcida e patética que tem dos homens e do mundo. Se contemplarmos o “Sabbath das Bruxas” ou olharmos para a gravura nº 39, onde satirizando a pequena nobreza que preferia empobrecer a ter de trabalhar, grava um jumento a olhar para o álbum dos seus antepassados, todos burros como ele, tendo ao pé da mesa o seu brasão e por baixo uma legenda “Hasta su abuelo”, compreende-se bem o receio do pintor, quando após a publicação das estampas, o governo de Godoy cai. Retiradas de circulação com apenas alguns exemplares vendidos, e receoso da Inquisição, vende-as ao Rei, a troco de uma pensão para o seu filho.

sábado, 26 de março de 2011

Branca de Bourbon – II

casamento medieval
A prisão da rainha deu origem a uma crise interna. Os toledanos compadecidos da sua sorte, promovem um motim, a que grande parte da nobreza adere, ao mesmo tempo que o Papa exorta o rei a retomar D. Branca como esposa.
Em 1354, D. João Afonso de Albuquerque é envenenado pelo seu médico, provavelmente a mando do monarca, mas os seus amigos depositam o corpo num ataúde que levam sempre consigo, dizendo ao rei que não o enterrariam enquanto não vencessem a demanda por Dona Branca. Este senhor de Albuquerque ficará para a História, como o “Do Ataúde”.
Obrigado a ceder, o rei acode a Toro onde vive algum tempo quase prisioneiro. Astuciosamente, consegue fugir para Segóvia e entrando em Toledo, manda abater vinte e dois” homens bons do comum” como represália por terem protegido a rainha. Conta-se que entre estes estava um ourives já ancião. O filho, ainda bem moço, pediu ao rei que poupasse o pai e o matasse a ele, ao que o rei acedeu.
Manda conduzir novamente D. Branca de volta a Arévalo, com ordens para que não tivesse nenhuma visita, nem mesmo de sua sogra. A partir daí, até à sua morte, a rainha ficou isolada do mundo. Pretendendo o rei casar-se com D. Joana de Castro, meia-irmã de Inês de Castro, cuja beleza o deslumbrou, obriga os bispos de Ávila e Salamanca a darem por nulo o seu casamento com a rainha, e a recebê-los como marido e mulher. Depois do casamento consumado, abandona para sempre a nova esposa, enviando-a para um convento, a qual, no entanto, lhe dará um filho, e se intitulará sempre como rainha de Castela.
Entretanto a pobre D. Branca é transferida para Jerez de la Frontera, onde pede aos monges do Mosteiro de S. Francisco, que a deixem ali ser sepultada quando morresse. Tempos depois foi enviada para a fortaleza de Medina Sidónia, já não tendo qualquer esperança de ver terminado o seu cativeiro. Com um mínimo de mobiliário, o conforto dentro daquelas paredes grossas era reduzido. Encerrada na torre, tendo por companhia apenas duas aias e o seu capelão, além da oração, apenas a tapeçaria lhe era permitida. Ao fim de tantos anos de prisão, era apenas uma pálida sombra da linda princesa cheia de sonhos, que um dia tinha chegado a Castela!
Em 1359 nasce um filho varão a Maria de Padilla, a quem puseram o nome de seu avô paterno, Afonso. O rei nomeia-o seu sucessor e para o legitimar pretende casar-se com a favorita.
Tinha por fim chegado a hora de se desfazer daquela incómoda cativa… Em 1361, acusando-a de conspiração, envia a Medina Sidónia, o seu melhor arqueiro, Juan Perez de Rebolledo com ordem para a matar, uns dizem que envenenada.
Tinha 25 anos de idade, e nada justificava tão triste sina! Desde o seu casamento, apenas tinha conhecido prisões e sofrimento, tudo aguentando com paciência.
No sec. XVI começaram as demolições do recinto amuralhado da fortaleza e da chamada Torre de D. Branca, onde segundo a tradição a rainha foi morta. Uma lápide lá colocada em 1859 recorda esse facto:


En esta torre estuvo presa
y acabó sus días a manos del ballestero
Juan Pérez de Rebolledo, en el año 1361,
la virtuosa y desventurada reina
doña Blanca de Borbón,
esposa de don Pedro de Castilla.

O seu corpo foi depois sepultado segundo o seu desejo, na igreja do Convento Franciscano de Jerez de La Frontera, sem honras nenhumas. Mais tarde, a Rainha Isabel, a Católica, manda restaurar a sua sepultura, pondo uma lápide a assinalá-la. No início do sec. XX, devido a obras de restauração na igreja, a lápide e a tumba foram colocadas na sacristia.
Segundo Lopez de Ayala, nas suas Cronicas de los Reyes de Castilla, conta ele que um dia estando o rei a caçar nas imediações de Medina, onde a rainha estava presa, se acercou um homem junto dele, dizendo-lhe que vinha por ordem de Deus avisá-lo que todo o mal que ele fizesse à rainha, lhe seria cobrado, mas que se a aceitasse como mulher, dela teria filhos que herdariam o reino.
Ficou o rei muito espantado, e mandou prender o homem, pensando que era a rainha que o tinha enviado. Mandou á fortaleza indagar se isto seria verdade, mas responderam-lhe que a rainha estava de tal maneira guardada, que lhe seria impossível enviar alguém. Então todos os que viram e ouviram isto pensaram que era obra de Deus. Soltaram depois o homem, e nunca mais ninguém o viu.


Fontes: Crónicas de Fernão Lopes
Cronicas de los Reyes de Castilla – Pero López de Ayala
Portugal Medievo – António Borges Coelho
Dicionário da História de Espanha, vol.I
www.mundohistoria.org
druta.wordpress.com
imagem:idademedianaescola.blogspot.com

quinta-feira, 24 de março de 2011

Branca de Bourbon – I


Se há princesas que nasceram fadadas para um destino infeliz, Branca de Bourbon foi uma delas.
Nascida em 1338/9, era uma das seis filhas de Pedro I, duque de Bourbon e de Isabel de Valois, sendo neta de Filipe III de França. Alguns historiadores dão-na como irmã gémea de Joana, mais tarde rainha de França pelo seu casamento com Carlos V.
Por volta de 1351, o rei de Castela Pedro I, o Cruel, manda uma embaixada a França, pedindo ao rei João, o Bom, uma das suas sobrinhas para esposa, sendo Branca a escolhida pelos embaixadores que a acharam formosa. Na verdade, este casamento tinha sido arranjado pela rainha-mãe D. Maria, filha de Afonso IV de Portugal, e viúva de Afonso XI, de Castela, e pelo valido João Afonso de Albuquerque, conselheiro do jovem rei.
Este, que contava apenas 16 anos na altura, mostrava já um carácter violento e propenso à astúcia e crueldade, embora inteligente e bem-parecido, pelo que, um casamento com uma jovem bonita e meiga como Branca poderia abrandar-lhe o feitio…
No princípio de 1353, já casada por procuração com o rei de Castela, a nova rainha sai de França, acompanhada pelo seu séquito chefiado pelo visconde de Narbonne, trazendo como dote 300 mil florins de ouro, que parece, nunca chegou a ser totalmente pago. Ao chegar à fronteira com Castela, apenas o senhor de Albuquerque a esperava, do noivo, nem a sombra!
Indignados com este procedimento, os enviados do rei de França exigem uma explicação, a que D. João Afonso responde aludindo a uma indisposição do rei. O que na verdade ele não poderia contar, é que neste intervalo de quase dois anos, o rei se tinha apaixonado loucamente por outra mulher, que já lhe tinha dado uma filha, e encontrava-se nessa altura, com ela, em Sevilha, onde passava a maior parte do tempo…Do casamento nem queria ouvir falar!
A dama em questão chamava-se Maria de Padilla, era pouco mais velha que Branca, e pertencia a uma família nobre. Até à sua morte, de causas naturais, em 1361, deu quatro filhos ao rei e à semelhança de Inês de Castro, também foi declarada rainha depois de morta.
Finalmente, a 3 de Junho, e cedendo apenas por razões de Estado, Pedro I casa com a princesa na catedral de Valhadolid. À saída, debaixo das aclamações do povo, enquanto Branca, radiante de formosura e felicidade, acenava à multidão, o rei mantinha-se distante e silencioso. Depois do banquete, D. Pedro abandona a noiva e volta para os braços de Maria.
A desconsolada rainha fica na companhia da sogra, até que D. João de Albuquerque consegue que o rei volte para uma reconciliação que dura apenas dois dias, findos os quais o rei parte para Olmedo. A rainha-mãe leva-a consigo para Tordesilhas e depois para Medina del Campo, mas por ordem do rei é conduzida à fortaleza de Arévalo, onde fica encerrada, sem que o rei torne a vê-la. Dali, é mais tarde conduzida para o castelo de Toledo.
Os nobres franceses do séquito da rainha voltam para França, onde relatam o sucedido, mas o rei de França, João II, o Bom, tinha sido aprisionado pelos ingleses na batalha de Poitiers, em 1356. Era uma época conturbada esta, vivida em plena Guerra dos Cem Anos, onde os camponeses fartos da sua miséria se revoltavam contra os senhores feudais, e a burguesia, cada vez mais forte, exigia mudanças políticas. O regente francês estava demasiado ocupado a negociar o resgate do pai, e pouco podia fazer por Branca, além de que ainda era devido a Castela o resto do dote…

segunda-feira, 21 de março de 2011

Dia Mundial…

Hoje, 21 de Março, quando se inicia a mais bonita estação do ano, celebram-se o Dia Mundial da Floresta e o Dia Mundial da Poesia.
Com a poesia de Miguel Torga, damos as boas-vindas à Primavera e homenageamos a Floresta, através de uma das suas árvores tradicionais

VIDA

Do que é a vida capaz!
A força dum alento verdadeiro!
O que um dedal da seiva faz
A rasgar o seu negro cativeiro!
Ser!
Parece uma renúncia que ali vai,
- E é um carvalho a nascer
Da bolota que cai!
Miguel Torga – Diário II, 4ª ed., 1977



GLÓRIA

Depois do Inverno, morte figurada,
A primavera, uma assunção de flores.
A vida
Renascida
E celebrada
Num festival de pétalas e cores.

Miguel Torga

domingo, 20 de março de 2011

Os Idos de Março – III


ANTONIO - Concidadãos, romanos, bons amigos, concedei-me atenção. Vim para fazer o enterro de César, não para elogiá-lo. Aos homens sobrevive o mal que fazem, mas o bem quase sempre com seus ossos fica enterrado. Seja assim com César. O nobre Bruto vos contou que César era ambicioso. Se ele o foi realmente, grave falta era a sua, tendo-a César gravemente expiado. Aqui me encontro por permissão de Bruto e dos restantes - Bruto é homem honrado, como os outros; todos homens honrados - para falar nos funerais de César. César foi meu amigo, fiel e justo; mas Bruto disse que ele era ambicioso, e Bruto é muito honrado. César trouxe numerosos cativos para Roma, cujos resgates encheram o tesouro. Nisso se mostrou César ambicioso? Mas Bruto disse que ele era ambicioso, e Bruto é muito honrado. Vós o vistes nas Lupercais: três vezes recusou-se a aceitar a coroa que eu lhe dava. Ambição será isso? No entretanto, Bruto disse que ele era ambicioso, sendo certo que Bruto é muito honrado.
PRIMEIRO CIDADÃO — Penso que em sua fala há muito senso.
SEGUNDO CIDADÃO — Se bem con¬si¬de¬rar¬des, procederam muito mal contra César.
TERCEIRO CIDADÃO — Sim, amigos? Temo que em seu lugar venha outro pior.
QUARTO CIDADÃO — Prestastes atenção no que ele disse? Recusou a coroa. Logo, é certo não ter sido ambicioso.
ANTONIO — Sabeis, amigos, o que estais a ponto de realizar? Em que mereceu César ser a tal ponto amado de vós todos? Ah! não o sabeis. Preciso então contar-vos. E o testamento, já vos esquecestes do que falei há pouco?
CIDADÃOS — É certo! É certo! O testamento! Ouçamos a leitura do testamento!
ANTONIO — Aqui vo-lo apresento ainda com o selo de César. César deixa para cada romano em separado setenta e cinco dracmas.
SEGUNDO CIDADÃO — Nobilíssimo César! Vamos vingar a morte dele!
TERCEIRO CIDADÃO — Oh real César!
ANTONIO— Além disso, deixou-vos os seus passeios, caramanchões privados e os recentes jardins por ele feitos neste lado do Tibre. Foi um César, realmente! Outro igual, quando teremos?
PRIMEIRO CIDADÃO — Nunca! Nunca! Sigamos para a praça sagrada, a fim de o corpo ali queimarmos, e com os tições as casas incendiemos de todos os traidores. Carreguemos o corpo.
SEGUNDO CIDADÃO — Trazei fogo.
TERCEIRO CIDADÃO — Derrubemos os bancos…

Depois da morte de César, rebentou uma luta pelo poder entre Marco António e Octávio, o futuro Augusto. A guerra civil desencadeada duraria cerca de quinze anos, conduzindo à queda da República e ao início do Império Romano. Mas antes, ambos vingaram César ao derrotarem Cássio e Bruto em 42 a.C., na batalha de Filipos, na Macedónia, onde os dois conjurados se suicidaram.


Fontes: Beggio, Valentina – César – Col. Grandes Protagonistas da Civilização
Grinberg, Carl – História Universal, vol.4
www.wikipedia.org
imagem: numismatas.com

sábado, 19 de março de 2011

Ao meu Pai


Mal me recordo de ti;
A última vez que te vi
Era muito pequenina,
Levavas a mãe contigo
(Espreitava-vos pelo postigo)
E duas malas na mão.

Nunca mais tornei a ver-te.
Não cheguei a conhecer-te
Porque a Morte, rude e ferina,
Cedo de nós te apartou,
Deixando no meu coração
Uma Saudade que ficou…

E já lá vão tantos anos!
Os meus sonhos e desenganos,
Medos, tudo o que vivi,
Tens acompanhado em pleno,
Do retrato, onde sereno
O teu olhar me sorri!

N.G.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Os Idos de Março – II


Cheios de pânico e horrorizados, os senadores fugiram sem tentarem defender César, e Bruto que tinha um discurso preparado, ficou sem auditores. Espalharam-se então pelas ruas gritando: “Morte ao tirano” e “Liberdade e República”.
No meio do caos que se gerou a seguir, porque os conjurados não tinham planeado nada para regularizar o governo de Roma, Marco António passou à acção, preparando as exéquias de César.
Diante da Assembleia do Povo pronunciou uma comovente oração fúnebre e leu o testamento que este deixara, em que legava ao povo os seus jardins para que aí se fizesse um parque, e a cada um dos 250.000 romanos pobres uma quantia em dinheiro. Depois, levantando a mortalha que envolvia César, mostrou ao povo as suas feridas e a túnica ensanguentada, provocando um coro de lamentações e uma indignação geral contra os seus assassinos.
Shakespeare descreve magistralmente, no Acto III, Cena II da sua tragédia intitulada “Julio César”, a mudança de sentimentos que se deu na população, inicialmente a favor dos conjurados…Não resisto a transcrevê-la, embora não na sua totalidade e adaptada.

ACTO III – Cena II

BRUTO - Romanos, concidadãos e amigos! Ouvi a exposição da minha causa e fazei silêncio, para que possais ouvir. Crede em minha honra e respeitai minha honra, para que possais acreditar nela. Se houver alguém nesta reunião, algum amigo afectuoso de César, dir-lhe-ei que o amor que Bruto dedicava a César não era menor do que o dele. E se esse amigo, então, perguntar por que motivo Bruto se levantou contra César, eis minhas resposta: não foi por amar menos a César, mas por amar mais a Roma. Que teríeis preferido: que César continuasse com vida e vós todos morrêsseis como escravos, ou que ele morresse, para que todos vivêsseis como homens livres? Por me haver amado César, pranteio-o; mas por ter sido ambicioso, matei-o. Logo: lágrimas para a sua amizade, e morte para a sua ambição. Haverá aqui, neste momento, alguém tão vil que deseje ser escravo? Se houver alguém nessas condições, que fale, porque o ofendi. Haverá alguém tão grosseiro para não querer ser romano? Se houver, que fale, porque o ofendi. Haverá alguém tão desprezível, que não ame sua pátria? Se houver, que fale, porque o ofendi. Faço uma pausa, para que me respondam.
CIDADÃOS — Ninguém, Bruto; ninguém.
CIDADÃOS — Viva Bruto! Viva! Viva!
PRIMEIRO CIDADÃO — Levai-o para casa triunfalmente.
BRUTO — Caros concidadãos, é meu desejo voltar só para casa; porém peço-vos que por amor de mim fiqueis com Antonio. Prestai honras ao corpo, aqui, de César, e ao discurso em que Antonio há- de suas glórias enaltecer, o que lhe permitimos. Encarecidamente a todos peço que, a não ser eu, ninguém daqui se arrede até que Marco Antonio haja falado.


terça-feira, 15 de março de 2011

Os Idos de Março - I


“Acautelai-vos com os Idos de Março” avisara-o um adivinho, tempos atrás.
Mas Júlio César não dera nenhuma importância ao aviso, (naquela altura, os dias do mês não eram identificados por números como hoje. Os meses eram divididos em calendas, idos e nonas. Os Idos eram a 15 de Março, Maio, Julho e Outubro, nos restantes meses eram no dia 13).
Estava-se no ano 44 a.C., e os Idos tinham chegado. Na noite anterior César e a mulher, Calpúrnia, estiveram a jantar em casa de Emílio Lépido e durante o serão caíra a conversa sobre o género de morte que cada um desejaria para si e César dissera que gostaria que fosse rápida e inesperada.
Tinha horror à doença física, à fraqueza e ao desgaste do corpo e a epilepsia de que sofria, embora fosse uma doença considerada sagrada pelos Romanos, fazia-o perder o controlo sobre si mesmo, o que lhe desagradava profundamente. Regressaram a casa, mas durante a noite, uma rajada de vento tinha escancarado as portas e as portadas das janelas, despertando César de um sono inquieto.
Ao outro dia, 15 de Março, havia uma reunião do Senado e César sentindo-se indisposto, estava hesitante entre ir ou ficar. Calpúrnia também estava inquieta, sonhara que abraçava um César moribundo…
Mas Décimo Bruto, um dos senadores que fora lá a casa para o acompanhar à reunião, troçando dessas superstições, convenceu-o a ir com ele. Sem fazer caso dos apelos de sua mulher, César respondeu-lhe: “Só se deve temer o próprio medo”, e saiu.
A sessão do Senado que estava marcada para esse dia, no corredor anexo ao teatro de Pompeio, no Campo de Marte, destinava-se a determinar qual o título que o ditador, que a 14 de Fevereiro tinha abdicado à quarta ditadura, para assumir a ditadura vitalícia, usaria ao assumir o comando das legiões romanas na guerra que se iria desencadear contra a Pérsia.
Mas os livros sibilinos, os livros sagrados que eram consultados em ocasiões muito especiais, tinham revelado que os Partos só seriam derrotados por um rei…E Roma era uma Republica…
E em Fevereiro, durante os festivais dos Lupercais, Marco António, o seu mais fiel amigo, tinha-lhe oferecido uma coroa, por entre os aplausos da multidão, que César recusou. A cena repetiu-se três vezes, e à terceira, o ditador não ordenou que a coroa fosse entregue a Júpiter!
Para os sessenta ou oitenta conjurados, de que Décimo Bruto fazia parte, a República parecia perdida. César venceria de certeza a guerra, e parecia ser sua intenção unir a realeza dos soberanos orientais com os louros de imperador dos romanos…Era necessário agir, eliminar o ditador e fazer a Republica renascer qual Fénix renascendo das cinzas!
No caminho para o Campo de Marte, César encontra de novo o adivinho e zombando dele, disse-lhe que os Idos de Março já tinham chegado, mas o outro responde-lhe que já tinham chegado, mas ainda não tinham acabado… Um pouco mais à frente, um cidadão com uma súplica, um rolo, aproxima-se dele, mas César entrega-a a um dos seus secretários, dizendo que a leria depois, sem imaginar que o rolo continha na realidade, toda a revelação da conjura, incluindo nomes e datas…
Entrou então na cúria, enquanto Marco António era retido cá fora por um dos conjurados, sob qualquer pretexto.
Conta Suetónio: “Quando ele se sentou, os conjurados puseram-se à sua volta como que em atitude de deferência; e de repente Cimbro Tílio aproximou-se mais, como se quisesse pedir-lhe algo, e uma vez que César recusava e com o gesto mostrava querer adiar para mais tarde, agarrou-o pela toga, abanando-o pelos ombros. César gritou: Mas isto é violência! E então um deles atacou-o com um punhal, ferindo-o abaixo da garganta. César agarrou-lhe o braço, trespassou-o com o punhal e tentou escapar; mas um segundo golpe deteve-o. Como viu que estava a ser atacado por todos os lados com punhais desembainhados, envolveu a cabeça na toga puxando com a mão esquerda as pregas para baixo, para que caísse mais dignamente, com a parte inferior do corpo também tapada. E assim foi trespassado por vinte e três punhaladas; soltou um gemido, sem uma palavra, apenas à primeira punhalada, se bem que alguns tenham afirmado que disse a Marco Bruto quando este o atacou: Também tu, meu filho? Ficou algum tempo por terra, inanimado, tendo fugido todos, até que três servos o colocaram numa liteira, com um braço pendente e o levaram para casa”.
Quando Marco António conseguiu entrar na cúria, tudo estava terminado!

segunda-feira, 14 de março de 2011

Jardim do Príncipe Real

Quem passa pelo Jardim do Príncipe Real, em Lisboa, provavelmente não imagina a movimentada história que possui, desde os tempos em que no sec. XVI., aqueles terrenos eram chamados de “Chãos da Ferroa”, ou “Alto da Cotovia”, e considerados a lixeira do Bairro Alto.
No sec. XVII, João Gomes da Silva Teles, filho do Marquês de Alegrete, recebe através do seu casamento, o Condado de Tarouca, onde se incluíam os terrenos do Alto da Cotovia. Resolve construir ali um palácio luxuoso, que acaba em ruínas por não ter sido concluído, ficando o local, em 1740, novamente para lixeira.
As terras são depois vendidas á Companhia de Jesus, que mandando limpar o terreno, inicia a construção do Colégio das Missões, completamente destruído mais tarde pelo terramoto de 1755, ficando de novo tudo em escombros, sendo aí montados acampamentos para os regimentos militares a quem o Marquês de Pombal encarregara da limpeza e segurança da cidade, e onde permaneceram por vários anos, tendo ali sido erguida uma das forcas da cidade.
É também ali instalada provisoriamente a Paróquia da Encarnação, e, mais tarde, constrói-se a nova Sede Patriarcal, onde se chega a dizer missa num barracão montado para o efeito, mas em 1769 um violento incêndio criminoso deixa-a em ruínas, passando o local a ser conhecido por “Patriarcal Queimada”. O seu autor foi Alexandre Francisco Vicente, ali empregado, que assim encontrou forma de esconder os roubos praticados, e também de ficar sem as duas mãos, punição que lhe foi aplicada no próprio local por tão sacrílego crime.
Em 1789, resolve-se aproveitar o local para construir o edifício do Real Erário, a Tesouraria Central do Reino, por proposta do Visconde de Vila Nova de Cerveira, ministro da Fazenda no reinado de D. Maria I. Considerada demasiado dispendiosa, apenas são construídas duas fiadas de cantaria acima do terreno, sendo o projecto abandonado, ficando novamente para entulho, até que em 1835 os terrenos são entregues à Câmara Municipal de Lisboa.
Finalmente, em 1856 é projectado o Reservatório de Água da Patriarcal, cujas obras terminam em 1864, sendo em 1859 executada a construção do grande tanque, um projecto da autoria do engenheiro francês Mary. Recebendo inicialmente as águas do Aqueduto das Águas Livres, foi na época o mais importante tanque no sistema de distribuição de água realizada para a baixa da cidade. O reservatório subterrâneo do tanque, com ligações aos chafarizes do Século, do Loreto e de S. Pedro de Alcântara, apresenta 31 pilares com 9,52 m. de altura, sobre os quais assentam os arcos da abóbada que suporta o lago exterior. Faz parte do Museu de Água da EPAL, e pode ser visitado pelo público.
Em homenagem ao herdeiro do reino, o futuro D. Pedro V, dá-se-lhe o nome de Praça ou Largo do “Príncipe Real”.
Dez anos mais tarde, em 1869, passa a dispor de iluminação, sendo também ajardinado segundo o projecto de João Francisco da Silva, que juntamente com Bonnard, o jardineiro do reino contratado pelo rei D. Fernando II, também tinha desenhado o Jardim da Estrela.
É um jardim de traçado romântico inglês, com uma área de 1,2 hectares, apresentando uma planta trapezoidal, com percursos sinuosos entre canteiros de plantas e flores multicores, rodeando um grande tanque octogonal, cujo desenho deriva da forma de uma parte do edifício do Real Erário que nunca chegou a ser construída, tendo ao centro, um repuxo.
Nele se destacam várias espécies de árvores, 6 das quais foram classificadas de interesse público, salientando-se o enorme cedro-do-Buçaco, o ex-libris da praça, com 20 metros de diâmetro.
Com a queda da monarquia, o Jardim passa a chamar-se Praça Rio de Janeiro entre 1911 e 1919, sendo oficialmente designado em 1925 por Jardim França Borges, em homenagem a este jornalista republicano. Mais tarde, o seu antigo nome de “Príncipe Real” volta a ser retomado, e actualmente é conhecido por qualquer destas designações.
De 1950 a 1960 funcionava ali, uma biblioteca municipal móvel, e de 1963 a 1970, durante grande parte do Verão, uma feira.
Além de um parque infantil, possui também mesas de jogos, esplanadas, quiosques, bebedouros, realizando-se ali vários eventos, em que o mercado semanal (aos sábados), de produtos de agricultura biológica é um deles.
Ornamentado por obras de estatuária, podemos apreciar o monumento ao jornalista França Borges, feito por Maximiano Alves, constando de um medalhão de bronze com a efígie do jornalista e a figura da República, um busto do Dr. Sousa Viterbo, da autoria de Francisco dos Santos, e uma escultura em memória do 1º centenário da morte do poeta Antero de Quental, colocada no jardim em 1991, da autoria de Lagoa Henriques.
É também citado, tanto na literatura estrangeira como na nacional, por escritores como John Le Carré, em “A Casa da Rússia”, ou por Eça de Queirós, no seu famoso romance “Os Maias”.

Fontes: França, José Augusto – Lisboa Pombalina e o Iluminismo
Revista Jardins, nº 92
Museutransportesmunicipais.cm-lisboa.pt
Aps-ruasdelisboacomhistoria.blogspot.com
e.cultura.pt
purl.pt

quinta-feira, 10 de março de 2011

Do amor:

Amor com amor se paga
Amor, a quanto obrigas.
Amor primeiro não tem companheiro.
Amor da praia fica enterrado na areia.
A Lua e o amor quando não crescem diminuem.
O amor não se concerta com desigualdades.
Ama ao bom para que te ame, e ao mau, para que não te difame.
Arrufos de namorados são amores dobrados.
A amar e a rezar, ninguém se pode obrigar.
Amor ausente, amor para sempre.
O amor exalta, a admiração é muda.
Casamento, apartamento.
Casamento e mortalha, no céu se talha.
Casamento rápido, arrependimento longo.
Casamento molhado, casamento abençoado.
Depois do casamento, vem o arrependimento.
Casarás e amansarás
De amor que não convém, vem o mal e nunca o bem.
Homem apaixonado, não admite conselhos.
Julgam os namorados que todos têm os olhos fechados.
Lágrimas de noiva são como chuva, alegra e não dura.
Mãos frias, coração quente, amor para sempre.
Mal finge quem quer bem.
Noivado prolongado, casamento desmanchado.
No amor e na guerra vale tudo.
Não há amor como o primeiro, nem luar como o de Janeiro.
O primeiro suspiro de amor é o último de sabedoria.
O amor cria o mundo, o dever governa-o.
O amor e a morte vencem o mais forte.
O homem deseja, a mulher ama.
Onde manda o amor não há outro senhor.
O amor faz passar o tempo e o tempo faz passar o amor.
Onde há amor, há dor.
O amor é eterno enquanto dura.
O amor é como um passarinho, não aceita gaiola.
O amor e o poder não querem sócios.
O amor e a tosse não podem ser escondidos.
Para onde pende o coração, para aí vai a razão.
Quem casa quer casa.
Quem o feio ama, bonito lhe parece.


terça-feira, 8 de março de 2011

Dia Internacional da Mulher


MULHER

Tem sempre presente que a pele se enruga, o cabelo embranquece,
Os dias convertem-se em anos…
Mas o que é mais importante, não muda;
A tua força e convicção não têm idade.
O teu espírito é como qualquer teia de aranha.
Atrás de cada linha de chegada, há uma de partida,
Atrás de cada conquista, vem um novo desafio,
Enquanto estiveres viva, sente-te viva!
Se sentes saudades do que fazias, volta a fazê-lo,
Não vivas de fotografias amarelecidas…
Continua, quando todos esperam que desistas!
Não deixes que enferruje o ferro que há em ti.
Faz com que em vez de humilhação, haja respeito…
Quando não conseguires correr através dos anos, caminha,
Quando não conseguires caminhar, usa uma bengala,
Mas nunca, nunca te detenhas!



sexta-feira, 4 de março de 2011

Botticelli – II

O Nascimento de Vénus

Este quadro de Sandro Botticelli, pintado cerca de 1484, e pertencendo à colecção da Galeria dos Uffizzi, em Florença, foi a primeira obra de grandes dimensões (172,5x278,5) da época do Renascimento, com um tema exclusivamente mitológico, produto do pensamento neoplatónico, em que a deusa se afirma como a alegoria do Humanismo. Nesta época, o corpo representava a encarnação da beleza ideal.
Vénus, a deusa romana da beleza e do amor, nasceu quando Urano foi castrado por Saturno, e os seus órgãos genitais atirados ao mar. Da espuma que se formou, nasceu a deusa, que empurrada por ventos favoráveis, chegou a Pafo, na ilha de Chipre, ou até Cítera, na ilha grega com o mesmo nome, onde a vestiram e adoraram. Aceite no panteão dos deuses gregos como Afrodite, passou depois para o romano, com o nome de Vénus. Foi sempre uma deusa indomável, tal como o mar de onde veio, e tal como ele, o amor que representa é sempre imprevisível, misterioso e quase sempre dominador.
O filósofo grego Platão estabelecia uma distinção entre Afrodite Urânia, cujo amor era espiritual (ou divino), e Afrodite Pandemon, que representava o amor secular (ou profano).
Neste quadro, representando o nascimento da deusa, Vénus, no centro da composição, ergue-se em cima de uma concha, tapando pudicamente o corpo com as mãos e com o auxílio da sua longa cabeleira dourada, enquanto é impelida para a ilha pelas ondas e por Zéfiro, o deus do vento Oeste, que abraçado a sua esposa Clóris, sopra suavemente. Representam o “espírito do amor” que enforma e molda a matéria.
É aguardada por uma das Horas, ninfas que presidiam às estações do ano. Pelo vestido florido que ostenta, esta divindade representa a Primavera, a estação do renascimento e da renovação. Na cintura leva uma faixa de rosas e nos ombros uma grinalda de mirto, símbolo do amor eterno. Aos seus pés, uma anémona azul reforça a ideia da chegada da Primavera. Nas mãos traz o manto cósmico destinado a cobrir a nudez da deusa. O manto rosado, está decorado com açucenas, símbolo de pureza, pois a deusa nua, que aparece no mais puro esplendor da sua beleza, e sem qualquer sombra de erotismo, é a Vénus Urânia, inspiradora do “amor celeste”.
De acordo com o ideal do neoplatonismo, o quadro tem também uma simbologia cristã, pois a concha e a água estão associadas ao baptismo, e os zéfiros, munidos de asas, parecem anjos transmitindo à deusa o seu sopro divino.
No laranjal, as árvores estão cobertas de flores brancas, pontilhadas de ouro, tal como as árvores que apresentam traços da mesma cor, sendo o ouro consagrado à realeza ou á divindade.
Uma chuva mística de rosas, a flor sagrada de Vénus, tomba sobre o mar, simbolizando o amor, ao mesmo tempo que os seus espinhos são como que um aviso de que este sentimento também pode ser doloroso.
O belíssimo rosto da deusa, enquadrado pela sua longa cabeleira, ostenta uma expressão distante, como se estivesse num mundo só seu, perdida nos seus pensamentos, o que era habitual nas pinturas de Botticelli. A sua postura é igual a uma estátua de mármore da Antiguidade Clássica, chamada “Venus de Médici”, pertencente à colecção dos Médici.
Uma versão estilizada da cabeça desta Vénus está reproduzida nas moedas italianas de dez cêntimos do euro.



Fontes: Europa do Renascimento, Col. Grandes Civilizações
Os Grandes Artistas, Difusão Cultural
www.infopedia.pt
pt.wikipedia. org

terça-feira, 1 de março de 2011

Botticelli – I

Possível auto-retrato

Um dos mais célebres pintores da segunda metade do século XV, durante o período do Renascimento italiano, foi Alessandro di Mariano Filipepi, mais conhecido por Sandro Botticelli. Nascido em Florença, a 1 de Março de 1444, onde passou praticamente toda a sua vida, aí faleceu em 1510. Apenas de 1481a 1482, chamado pelo Papa Sisto IV, se deslocou a Roma para uma curta estadia, onde pintou os frescos da Capela Sistina (A Missão de Moisés, O Castigo de Cora, Datan e Abiron e a Tentação de Cristo), o que mostra bem o valor da sua reputação na época.
O mais novo de cinco irmãos, começa a sua carreira aprendendo ourivesaria com um ourives cujo apelido, Botticelli, ele adopta para o seu nome artístico. Em 1461 entra como aprendiz para o atelier de Fra Filippo Lippi, onde permanece até 1467?, associando-se depois a Antonio Pollaiuolo e Verrochio. Em 1470 abre o seu próprio estúdio, onde pinta os primeiros quadros, geralmente Madonas, encomendadas por guildas e clientes privados, tornando-se ele próprio, em 1472, membro da St.Luke’s Guild, uma associação de caridade gerida por artistas, e dois anos depois, pinta o quadro de S. Sebastião, para a Igreja de Santa Maria Maior, em Florença.
A sua pintura, toda em linhas e luz, exprime sobretudo a natureza juvenil, o sonho e a melancolia. As suas personagens surpreendem pela elegância e pelo mistério que as parece envolver. Os rostos das suas Madonas exprimem todo o ideal da beleza feminina, e os seus nus são belíssimos, cobertos com véus transparentes e longas cabeleiras doiradas.
Trabalha para as grandes famílias florentinas, e, quando em 1476 faz o retrato de Giuliano de Médicis, e pinta a Adoração dos Reis Magos, é colocado sob o patronato e protecção desta família de banqueiros, autênticos mecenas das artes, participando nos círculos intelectuais e artísticos que rodeiam Lorenzo, o Magnífico, onde absorve toda a influência do neoplatonismo cristão presente nesses círculos. Esta filosofia, que exaltava o corpo humano como representando a harmonia do Mundo, aliando a cultura clássica greco-romana, ou seja, o Paganismo ao Cristianismo.
São deste período, as pinturas “pagãs” que executa para a decoração da villa Castello, fazendo renascer temas da mitologia greco-romana de que são exemplo “O Nascimento de Vénus” e “A Primavera”.
Depois da morte de Lorenzo de Médicis, Botticelli sofre uma crise espiritual, e torna-se discípulo do monge dominicano Girolamo Savonarola, queimando várias das suas obras na célebre “Fogueira das Vaidades” instituída por este monge, e a sua pintura sofre um retrocesso, torna-se mais sóbria, de uma intensa devoção religiosa, como nas pinturas medievais, de que são exemplo as Pietá, ou “O Milagre de S. Zenóbio”
Faz algumas ilustrações para a Divina Comédia de Dante, mas os seus últimos anos são ensombrados pela doença e dificuldades económicas Morre a 17 d3 Maio de 1510, na sua cidade natal, e a sua obra praticamente esquecida após a sua morte, só no século XIX volta a adquirir o êxito e a fama que merece.

Madona do Magnificat

Fontes: wikipedia.org
Europa do Renascimento – Col. Grandes Civilizações – Selecções do Reader’s Digest
Gerlings, Charlotte - 100 Great Artists, Eagle Editions