quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Tradições do Natal – III

“Tempo Velho, Tempo Novo”

Desde o fundo da Idade Média que se celebram as Festas de Natal, cujas origens pagãs se foram diluindo ao longo dos tempos, subsistindo no entanto alguns dos seus rituais, de que muitas vezes ignoramos o significado, perdida que está a sua anterior simbologia.
A comemoração ocidental de Janeiro como o Dia de Ano Novo, tem origem num decreto de Júlio César, em 46 a.C. Os romanos dedicavam esse dia a Jano, o deus da duas faces, uma virada para a frente e a outra virada para trás, representando o passado e o futuro, o fim e o princípio. Era também chamado o “Deus das Portas”, responsável por abrir as portas para o ano que se iniciava.
Para os povos antigos, o “Ano” era um ciclo temporal com início e fim. Quando esse fim chegava era necessário renová-lo, tendo para isso de se efectuarem rituais, de modo que o Mundo pudesse entrar num novo ciclo em ordem.
Á medida que o solstício do Inverno se aproximava, os povos antigos acendiam fogueiras para lembrar ao Sol oculto pelo céu cor de chumbo, que a sua morte era só aparente, e na Primavera ressuscitaria do seu combate às trevas invernais. No nosso país, é costume nas aldeias acenderem-se as fogueiras na rua, as chamadas fogueiras do galo, que devem permanecer acesas desde o Natal até aos Reis.
Em Trás-os-Montes, que, de todas as províncias portuguesas é aquela onde melhor se conservam os antigos rituais da passagem do solstício do inverno, especialmente no planalto mirandês, no dia 26 de Dezembro, dia de St. Estêvão, o Chocalheiro de Bemposta, Mogadouro, sai à rua para desempenhar os seus ritos mágicos.
Diz a lenda que o demónio tentou Nossa Senhora, e como castigo foi condenado a “pedir” esmola para Ela e para o Menino Jesus. Assim, no dia 26 de Dezembro sai para pedir esmola para Nossa Senhora das Neves, e no dia 1 de Janeiro, sai a pedir para o Menino Jesus.
Vestido de linho grosso geralmente tingido de preto, ostenta na cabeça uma máscara tauromórfica de madeira. Nas pontas dos chifres tem duas laranjas espetadas; cai-lhe do queixo uma barbicha de bode e escorrendo pela face tem uma pequena serpente. Da nuca pende-lhe uma bexiga de porco cheia de vento, e na testa tem um disco. Na mão segura uma tenaz, tendo à volta da cintura uma serpente de pano de grande porte.
O homem que usa a máscara (que é comunitária, assim como o trajo), fá-lo geralmente para pagar uma promessa ao Menino Jesus. Ninguém sabe quem ele é, a máscara tem de ser entregue até ao pôr-do-sol e é-lhe proibido entrar na igreja mascarado. Ao toque das Trindades é obrigado a recolher.
Figura demoníaca para o povo, ele é um resquício do culto à Grande Deusa Mãe. Na civilização cretense, assim como em algumas civilizações do antigo Oriente, o touro estava ligado ao deus-sol e à sua força criadora. A serpente simboliza a sabedoria, a fecundidade e também a imortalidade. Quando o Chocalheiro sai à rua no dia 26, tem a função de anunciar o nascimento do Sol Invictus (festa romana que se celebrava a 24 e 25 de Dezembro), ou em termos cristãos, o nascimento de Jesus, o novo Sol ou Luz do Mundo. Quando sai no 1º de Janeiro, tem por missão afastar os espíritos do Velho Tempo e despertar os espíritos benfazejos do Novo Tempo. A fruta que ostenta nos chifres é o símbolo da boa colheita que se deseja para o novo ano.
A 27 de Dezembro, dia de S. João Evangelista, um santo que está associado ao solstício do inverno (em oposição a S. João Baptista, associado ao solstício de Verão), saem o Carocho e a Velha em Constantim, Miranda do Douro.
O Carocho veste um fato grosseiro, e ostenta uma máscara de couro na cabeça. Na mão traz um garfo de madeira de grandes dimensões, com que tira as peças do fumeiro, no pescoço tem um rosário de carretas de linhas, já vazias. Do queixo da máscara sai uma barbicha de bode, como a do Chocalheiro, e calça umas galochas ou botas, com polainas por cima.
A Velha veste saia, blusa de chita estampada, lenço na cabeça, xaile, um saco no ombro esquerdo e um rosário de castanhas assadas ao pescoço. Na mão direita segura uma estaca com que recolhe as esmolas de fumeiro.
Percorrem as ruas, ao som do tambor, flauta e gaita- de- foles, dançando, dando saltos e dizendo graçolas, ao mesmo tempo que vão recebendo peças de fumeiro, cereais e dinheiro para a festa de S. João. Com esta esmola pagam a festa do santo, e as peças de fumeiro destinam-se à festa comunitária que se realiza na véspera do Ano Novo, e onde participam todas as pessoas da aldeia, mais aquelas que os mordomos da festa convidaram.
Esta festa tem origem em rituais dionisíacos, aparecendo vestígios de antigo comunitarismo.
A Velha de Vila Chã da Barciosa, em Miranda do Douro, é representada por um homem vestindo uma saia preta de burel, enfeitada com rendas e bordados brancos. Enverga um casaco velho de burel preto e calça sapatos de bezerro. Na cabeça, leva um chapéu preto roto e sujo, enfeitado com fitas de várias cores. Ao pescoço traz um rosário de bugalhos com uma cruz de cortiça queimada, com que marca as moças solteiras. Na mão esquerda segura uma estátua de pau onde pendura os alimentos que lhe vão sendo dadas. Na mão direita segura uma bengala forte, que tem na extremidade algumas bexigas de porco cheias de vento, com que amedronta a criançada.
É acompanhada por um rapaz vestido de pauliteiro e por outro rapaz vestido de mulher. Dançam ao som da gaita e do bombo, a dança da “bicha”. Os mordomos seguem-nos recolhendo cereais, pão cozido, fumeiro e vinho, que depois são leiloados e o que sobra destina-se também a uma ceia colectiva.
A Velha é uma figura associada ao Diabo, símbolo da desordem e do caos, de onde surge uma nova ordem, o fim do “Tempo Velho” e começo de um “Tempo Novo”.
O Farandulo de Tó, em Mogadouro, forma com a “Sécia” e o moço, um conjunto ritual, cuja festa se celebra no dia de Ano Novo. O Farandulo é a figura principal do cortejo, pois representa o Velho por oposição ao Novo, as Trevas por oposição à Luz.
Veste saia de burel, velha e rota, e usa um casaco velho virado do avesso, ao pescoço traz um rosário de bugalhos de carvalho. A cara está enfarruscada com cortiça queimada.
A “Sécia” veste de rapariga nova, com saia e blusa sempre branca, com um véu de noiva até aos ombros. Numa das mãos segura um cestinho e na outra um ramo feito de um ramo de arvore despido de folhas, com uma laranja ou tangerina no topo e enfeitado com doces e «rosquilhas», que mais tarde será leiloado.
O moço veste fato normal. Na mão traz uma aguilhada para defender a “Sécia” do Farandulo que tenta enfarruscá-la.
Vão também acompanhados pelo mordomo, que traz um saco para a recolha. Tal como todos os outros também dançam ao som da gaita e do bombo. Só que o Farandulo nunca segue o caminho a direito; salta, pula muros, investe contra a “Sécia”, obrigando o moço a estar sempre de aguilhada em riste para a defender não a deixando enfarruscar.
Na luta entre o Farandulo e a “Sécia” podemos observar uma luta entre a Luz e as Trevas. O moço representa o poder invisível que defende a Luz ainda muito jovem, contra as Trevas que a querem impedir de brilhar.
O ritual de se marcarem as moças com a cruz de cortiça queimada tem origem nas festas Lupercalia e Floralia, dos antigos romanos, em que os homens tocavam nas mulheres para as tornar fecundas.
Estes festejos iniciavam-se logo pela manhã do dia de Ano Novo, mas na véspera, dia de Ano Bom (30 de Dezembro), acendiam-se as fogueiras purificadoras.
Esperemos que estas festas tão cheias de significado, não se vão diluindo também com a passagem do Tempo.



Fontes:www.wikipedia.org
mogadouro.com
Aeiou.expresso.pt
Eduardo Amarante – Mitos e lugares mágicos de Portugal


quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Um Conto de Natal


À roda da lareira, aquecidos pelo fogo do “canhoto” que ardia alegremente, a neta perguntou à doce velhinha que, sentada no “escano” aquecia as mãos ao lume:
-Avozinha, quando eras menina, como nós, queimavam-se “canhotos” assim tão grandes?
-Assim grandes e maiores. Ainda me lembro…E o meu pai contava-nos a história do “canhoto”.
-Conta, avozinha, conta lá…
A restante garotada largou nozes e pinhões, juntando-se à volta da avó para ouvirem a história:
-“Quando Jesus, o Deus Menino, nasceu numa noite escura e fria, já a neve branqueava o largo campo de Belém. Os pastores, alertados pelo Anjo, ao chegaram à gruta desabrigada que lhe servia de casa, viram que a Virgem Maria tremia de frio, porque o seu manto velho e puído agasalhava Jesus. Condoído, um dos pastores correu a juntar uns paus secos e restos de lenha, fazendo com eles uma fogueira consoladora que depressa alumiou e aqueceu os que ali estavam. E juntando-se em redor do Menino, os pastores, acompanhados pelos Anjos que tocavam uma música divina cantaram “Glória a Deus nas alturas e paz na Terra aos homens de boa-vontade”.
Depois de acomodarem os rebanhos, reuniram-se, e para adormecerem o Deus Menino, cantaram-lhe baixinho:
Oh meu Menino Jesus
Oh meu Menino adorado,
Aqui tendes a visita
Dos pobres pastores de gado.

Ao verem que mesmo com o calor da fogueira, Nossa Senhora ainda tinha frio, um deles tirou vinho da sua cabaça e aqueceu-o no borralho, outro sacou do surrão um favo de mel, louro e cheiroso, que foi misturado ao vinho e dado de beber à Mãe do Redentor.
Assim, através do leite materno, Jesus saboreou, ao nascer, o saboroso vinho da Terra da Promissão e o doce mel das colmeias do Hebron.
E desta maneira nasceram dois costumes de fortes raízes tradicionais, que ainda hoje se mantêm: o fogo alimentado à lareira durante dias pelo “canhoto”, o pedaço de tronco de árvore velha, carcomido pelo tempo, e o confortador vinho quente, que o mel adoça e perfuma, bebido na santa Noite de Natal”.
- Meninos, para a mesa! Chama a mãe.
E alegres como passarinhos, os garotos debandaram…
Muitos séculos passaram, mas a recordação da fogueira acesa para aquecer a Mãe do Senhor, continua! E se a alegre revoada dos Anjos cantou e bailou em Belém à volta das labaredas que aqueciam o ambiente da desmantelada estrebaria, são agora as Almas, que também vêm de revoada a matar saudades dos que lhe são queridos e gozar do agradável calor do lume que, pela noite velha arde mansamente! É o Lume das Almas!
-Alminhas santas! – reza a velhinha, agora só, no canto da preguiceira. – Vindes friinhas das Alturas de Deus! Quentai-vos, está tanta neve a cair! Quentai-vos ao lume do Senhor e fazei-me companhia.
Pela sua enfraquecida memória vêm à recordação as loas que os velhinhos sabiam:

Alminhas benditas chegai-vos
Ao lume santo do lar,
Rogai a Deus que nos guarde
À vossa beira o lugar.

E embalada pelo calor do lume, a boa avó adormeceu…


Fontes: Natal, do Minho ao Algarve Açores e Madeira – Planeta Editora
Conto adaptado do texto “O Natal Minhoto”.

A Natividade de Jesus – II

Este mosaico na Igreja de Santa Maria, em Roma, também de Pietro Cavallini, como referimos no artigo anterior, mostra uma cena que, a partir do sec. XV foi proibida pela igreja: o banho do Menino. Jesus havia nascido puro e de natureza divina, era a própria fonte da vida.
As parteiras, que segundo os evangelhos apócrifos teriam sido chamadas por José, para auxiliarem a Virgem no parto e provarem a sua virgindade, foram suprimidas por porem em causa o parto indolor de Maria; se não havia dor, não havia também necessidade de auxiliares. Bastavam os Anjos, que sempre a acompanharam.
Em 1303, por influência das visões de Santa Brígida (padroeira da Suécia e co-padroeira da Europa), sobre o parto indolor de Maria, esta deixa de se apresentar reclinada ou deitada, e passa a figurar de joelhos, em adoração ao Menino. Também este passa a irradiar uma luz própria (a Luz do Mundo), deixando de ser iluminado pela estrela de Belém.
Assim, a iconografia ocidental vai eliminando a influência bizantina, e transforma a Natividade de Jesus, numa simples adoração ao Menino, dispondo as personagens principais, à sua volta, mantendo o burro e o boi, apesar da proibição imposta pelo Concílio de Trento. Jesus já não se apresenta envolto em faixas dentro de um berço de madeira parecido com um caixão, uma alusão bizantina à sua futura morte e ressurreição, mas nu, ao colo de Maria, ou muitas vezes no chão, como sinal da sua humanidade.
Frade Francke (c.1385-c.1436), pintor alemão de altares, do período Gótico internacional, com vocação para o realismo, decidiu passar para a tela a visão de Santa Brígida: A Virgem, com o manto deitado para trás seguro por anjos, está de joelhos rezando, e a meio da oração nasce o Menino. Ao vê-lo, Maria junta as mãos e diz: “Senhor meu e Filho meu…”. Dentro de uma nuvem, Deus Pai e o Espírito Santo observam o nascimento de Jesus, que brilha envolto na sua própria Luz.


Segundo a tradição, as primeiras imagens de Maria foram baseadas no “retrato da Virgem” pintado por S. Lucas, apresentando-a morena, de olhos e cabelos escuros, o que não é de admirar, dada a sua origem hebraica, mas nas pinturas ocidentais, e mais de acordo com os padrões de beleza para a época, a Virgem passou a ter a pele mais clara e cabelos entre o acastanhado e o ruivo.
O impacto do Concílio de Trento nas artes foi grande, pois se por um lado as apoia, por outro introduz normas rígidas de decoro, obrigando a que as roupas escondam o corpo, e mesmo o Menino deve figurar, ainda que desnudo, de uma maneira que não ofenda os ideais aprovados no Concílio, pois a arte deveria ser uma expressão de fé e um veículo de catequização num tempo em que a alfabetização era escassa e a Igreja, ainda enfraquecida pelo Grande Cisma, tinha de lutar contra a Reforma pregada por Lutero e Calvino. O maneirismo tornara-se especialmente impróprio para a representação sacra. A orientação da Igreja agora era na direcção de se produzir uma arte que pudesse captar a massa do povo, apelando para o sensacionalismo e uma emocionalidade intensa, a que o barroco correspondeu totalmente. Na pintura, a portuguesa Josefa de Óbidos, foi das pouquíssimas mulheres artistas deste período.
Com o correr dos tempos, novos estilos de pintura aparecem, mas o encanto e a fé no Nascimento de Jesus continuam a inspirar os artistas, como se pode ver no quadro abaixo “Natal no trópico”, de autor desconhecido.


Fontes: www.wikipedia.org
Revista Historia Y Vida, nº441
Imagem do último quadro:
peregrinacultural.worpress.com

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

A Natividade de Jesus - I


“ E quando eles ali se encontravam, completaram-se os dias de ela dar à luz e teve o seu filho primogénito, que envolveu em panos e recostou numa manjedoura, por não haver lugar para eles na hospedaria”. Lucas, 2, 6-8.
Independentemente do facto de Jesus muito provavelmente não ter nascido a25 de Dezembro, é nessa data que estamos habituados a festejar o Natal, ou mais propriamente, a Natividade de Jesus, pelo menos desde o ano de 354 d.C., quando o Papa Libério instituiu esta data como a do Nascimento de Jesus.
Do ciclo natalício fazem parte, a Anunciação, a Visitação, o Nascimento do Menino, a Adoração dos Reis Magos e a Apresentação no Templo, como se pode ver neste frontal do altar da igreja de Santa Maria de Aviá, o Frontal de Aviá, séc.XII, e que hoje se encontra no Museu Nacional de Arte da Catalunha. Pintado sobre madeira, entre 1170 a 1200, no estilo românico catalão, mas com influências bizantinas ou ítalo-bizantinas, está dividido em 5 partes, mostrando ao centro, dentro de um arco tribolado, a Virgem com o Menino, enquanto nos lados se descrevem as cenas acima citadas.
O rectângulo do canto superior esquerdo apresenta as cenas da Anunciação e a da Visitação, separadas por uma coluna. O Anjo ainda é representado de pé em cima de uma nuvem, tal como era costume na arte primitiva, antes do aparecimento da etiqueta cortesã feudal.
Não foi só o mestre de Aviá, a tratar artisticamente este tema. A Natividade é uma das cenas mais representadas de todos os tempos, e uma vez que S. Lucas é bastante escasso em pormenores, os artistas pintaram-no conforma a sua imaginação e a época em que viviam.
As primeiras imagens aparecem em sarcófagos, em Roma ou no sul da Gália, alguns deles anteriores à oficialização do culto por Constantino, sendo muito simples, apenas o Menino embrulhado em panos, numa cesta, ou em palhas na terra, acompanhado do boi e do burro. Embora não sejam mencionados nos Evangelhos, a sua presença nunca foi questionada até ao Concílio de Trento, pois Isaías dizia:” O boi conhece o seu possuidor e o jumento a manjedoura do seu senhor”, sendo mencionados num dos Evangelhos apócrifos. Santo Agostinho, Santo Ambrósio e outros consideravam-nos a representação do povo judeu oprimido pela Lei (o boi), e os povos pagãos carregados com o peso da sua idolatria (o burro). O Concílio de Trento, porém, considerou-os como animais pouco nobres e proibiu a sua representação.
Maria geralmente só aparecia na Adoração dos Reis Magos, mas a partir do sec. V, depois do concílio de Éfeso, passou a ser uma figura constante, o mesmo não acontecendo a S. José, que era uma figura variável.
A partir do sec. VI, as imagens bizantinas da Igreja Ortodoxa do Oriente adoptam a caverna em vez do estábulo e mostram a Virgem reclinada depois do parto com o Menino a seu lado, ajudada por parteiras que lavam Jesus, aparecendo este duas vezes no mesmo quadro. S. José aparece geralmente sentado, com o rosto apoiado numa mão, parecendo um pouco perdido. Os ícones ortodoxos modernos pouco mudaram.
No ocidente, os pintores, principalmente em Itália, adoptaram muitos destes elementos, como se pode ver neste mosaico, de uma série de seis sobre a vida da Virgem, na abside da Basílica de Santa Maria de Trastevere, em Roma, feitos em 1291, por Pietro Cavallini.

Fontes: en.wikipedia.org/wiki/Nativity- of- Jesus- in- art
Revista Historia Y Vida, nº 441
História da Arte, vol. 3, edições Alfa


domingo, 26 de dezembro de 2010

Tradições do Natal - II

A Missa do Galo

Celebrada em Roma na Basílica de Santa Maria Maior, desde o século V, na noite de 24 para 25 de Dezembro à meia-noite, conforme a tradição, era segundo S. Gregório Magno a comemoração do nascimento de Jesus no coração dos fiéis. Até ao sec. IV, a missa comemorativa do Natal celebrava-se durante o dia.
Quanto ao nome há várias versões: o galo foi o primeiro animal a presenciar o nascimento do Menino e ficou com a missão de a anunciar ao mundo. Simbolicamente, o galo é o anunciador de um novo dia, de uma nova luz que afasta as trevas, associando-o a Jesus, “Luz do Mundo”.
Pode simbolizar o galo que cantou 3 vezes quando Pedro renegou o Senhor, na noite da Sua prisão, com medo de ser preso também, lembrando as fraquezas humanas.
Ou pode também ser pelo facto de que quando as pessoas voltavam para casa, depois da Missa, era já tarde, pela hora em que os galos cantavam.
Em algumas aldeias portuguesas havia o costume de se levar um galo para a missa; se ele cantasse, seria um bom ano de colheita, se o não fizesse, seria mau. Em aldeias espanholas de Toledo, os lavradores matavam um galo no dia 24 em memória do que cantou 3 vezes para S. Pedro, levando-o para a igreja à noite, a fim de ser distribuído pelos pobres.
As novas normas de higiene pública determinaram o fim de uma das tradições mais antigas de adoração, o beijo no pé ou na testa do Menino Jesus, que o sacerdote apresentava no fim da Missa.
A seguir, as famílias regressavam a casa para a ceia, indo depois as crianças para a cama dormir, porque o Pai Natal só descia pela chaminé a distribuir os presentes, depois de tudo em silêncio.

1881 ilustração de Thomas Nast , que, com Clement Clarke Moore , ajudou a criar a imagem moderna do Papai Noel

Pai Natal ou Santa Claus

S. Nicolau, bispo de Myra, na Lycia, província bizantina da Anatólia (hoje Demre, na Turquia), que viveu no séc. IV e ficou conhecido pela sua generosidade para com os pobres, principalmente as crianças, foi um dos inspiradores da figura do Pai Natal. Fala-se também de S. Basílio de Cesareia, festejado no 1º de Janeiro, data em que os gregos trocam presentes.
Em 1882, em Nova Iorque, um professor de literatura grega escreveu para os seus seis filhos, um poema chamado “Uma visita de S. Nicolau”, contribuindo assim para a lenda do Pai Natal. Nesse poema, ele viajava de trenó puxado por renas e entrava pela chaminé. Nessa altura, o bom do “velhinho”, ainda não tinha uma vestimenta muito bem definida, geralmente de cor marrom e uma coroa de azevinho na cabeça.
A fatiota branca e vermelha com que o conhecemos, foi-lhe dada pelo cartonista Thomas Nast, em 1886, na revista Harper’s Weeklys, edição especial de Natal. Esta figura foi reforçada pela campanha publicitária da Coca-Cola.
A lenda de entrar pela chaminé pode dever-se ao facto de que naquela época, as pessoas geralmente mandavam limpar as chaminés por esta altura, para que a boa sorte lhes entrasse em casa. Outra explicação vem da Finlândia, onde os antigos lapões que viviam nos igloos circulares, cobertos com peles de rena, faziam um buraco no tecto para poderem entrar em casa.
O Pai Natal reside na Lapónia, numa terra sempre gelada, na companhia de sua mulher, de elfos e duendes que fabricam e o ajudam a embalar as prendas. Ao princípio, ajudado pelo gnomo mais velho, ia entregar as prendas a pé, mas como cada vez havia mais casas para visitar e cada vez mais longe, os gnomos e elfos, construíram um trenó para ele se poder deslocar. O problema é que não havia quem o puxasse… Puseram então vários anúncios para os animais que quisessem o emprego, aparecendo vários interessados, mas só as renas cumpriram todos os requisitos.
O Pai Natal contratou então oito, sendo as únicas renas do mundo que sabem voar, mas como foi necessário entrar o Rodolfo, com o seu nariz vermelho para as orientar durante as tempestades (Rudolph, a Rena do Nariz Vermelho – filme de 1960), passaram a ser nove. Os seus nomes são: Corredora, Dançarina, Empinadora, Raposa, Cometa, Cupido, Trovão e Relâmpago.
Para quem lhe quiser escrever, a direcção é:
Santa Claus
FIN-96930 Arctic Circle
Rovaniemi - Finlândia
http://www.santaclausoffice.fi

Fontes: wikipedia.org
Tieleb.wordpress.com
Emule.com.br

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

FELIZ NATAL


FELIZ NATAL…FELIZ NATAL…QUE SEJA UM BOM NATAL PARA TODOS NÓS…



Menino Jesus

Toca o sino, toca o sino
É Natal…Nasceu Jesus!
Adoremos o Menino
Nas palhas, tão pequenino,
Sorrindo tão meigamente
Convidando toda a gente
A amarem-se como irmãos,
Uns aos outros dar as mãos
Viver em paz e harmonia…
Cantemos com alegria
Agradecendo a Maria
E também a S. José.
Já se não lhe beija o pé
Por uma questão de higiene
Que os tempos são de mudança…
Mas continua na lembrança
Daqueles que cheios de fé
O faziam com amor
Pedindo ao Menino Deus
Que lhes mandasse dos Céus
A sua bênção perene!

N.G.

Imagem sinos: fardilhas.blogspot.com

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Tradições de Natal - I

A Árvore de Natal

Uma das tradições natalícias presente em quase todos os lares é a Árvore de Natal, geralmente uma conífera, enfeitada e iluminada de várias cores, à volta da qual se costumam dispor os presentes de Natal.
Mas essa árvore provém dos países nórdicos e é uma réplica da árvore do universo, as bolas com que são decoradas representam as esferas celestes. No topo dessa árvore havia um galo de ouro. O galo é simbolicamente um animal solar, anuncia o despertar da vida e precede o nascimento do Sol. Foi também emblema do cristianismo primitivo, representando Cristo como anunciador de uma nova luz, já que o seu canto representa a vitória da luz sobre as trevas.
Já os egípcios na Antiguidade levavam para casa folhas de palmeira, na altura do solstício de inverno, simbolizando a vida que se sobrepõe à morte. Por sua vez, os romanos, por altura das festas dedicadas a Saturno, as Saturnálias, que se celebravam no inverno, adornavam as suas casas com pinheiros. Os povos pagãos do Báltico levavam pinheiros para os seus lares, enfeitando-os de forma muito semelhante à actual, passando esta tradição para os povos germânicos.
Mas foi S. Bonifácio ( 672-755), o chamado Apóstolo dos Germânicos, ao abater o carvalho sagrado do bosque dos druidas, dedicado ao deus Thor, implantou o pinheiro como Árvore do Natal.
Conta-se que o Santo, em 723, salvou um príncipe de ser sacrificado ao deus pagão, derrubando o carvalho a ele dedicado, que ao cair arrastou todas as árvores à sua volta, excepto um pequeno pinheiro. Como estavam na altura do Natal, S. Bonifácio declarou que o pinheiro seria considerado a árvore do menino Jesus. Estava criada a Árvore do Natal.
A decoração da árvore com velas e a estrela, deve-se, segundo se diz, a Lutero, que depois de um passeio pela floresta no inverno, ao ver as estrelas brilharem no céu limpo por cima das árvores, decorou assim a sua árvore, porque, para ele, o céu deveria ter estado assim na noite do nascimento de Jesus.
A moda pegou, e a moderna árvore de Natal teve a sua origem na Alemanha, no sec. XVI sendo depois importada para a Grã-Bretanha, e mais tarde para os Estados Unidos. Em Portugal, como era de origem pagã, não teve grande aceitação, já que os presépios eram o símbolo do Natal. Aos poucos, no entanto, foi ganhando o seu lugar, e hoje tornou-se indispensável.


Conto - O pinheirinho do Natal

Conta-se que, quando os pastores foram adorar o Divino Infante, decidiram levar-lhe frutos e flores produzidos pelas árvores. Depois dessa colheita, houve uma conversa entre as plantas, num bosque. Regozijavam-se elas de ter podido oferecer algo ao seu Criador recém-nascido: uma, as suas tâmaras; outra, as nozes; uma terceira, as amêndoas; outras ainda, como a cerejeira e a laranjeira, haviam oferecido tanto flores quanto frutos.
Do pinheiro, porém, ninguém levou nada. Muito triste, pensou que também nada tinha para oferecer e que as suas folhas tão pontudas até poderiam picar o Menino…e as suas pinhas, para que serviam? E na sua infelicidade, nem sequer participou na conversa!
Um anjo que passava a caminho de Belém, comovido com a infelicidade do humilde pinheirinho, olhou para cima, para o céu estrelado e, a um aceno seu uma multidão de estrelinhas desceu, espalhando-se pelos seus ramos que ficaram iluminados. Eram de todos os matizes que existem no firmamento: douradas, prateadas, vermelhas, azuis…
Quando um outro grupo de pastores passou, levou não apenas os frutos das demais árvores, mas o pinheiro inteirinho, uma árvore de tal forma maravilhosa, da qual nunca se ouvira falar.
E lá foi o pinheiro ornar a gruta de Belém, sendo colocado bem junto do Menino Jesus, de Nossa Senhora e de São José. E no seu berço de palhas, os olhos de Jesus iluminaram-se também, ao verem uma árvore tão linda!
É por isso que ainda hoje, os pinheiros se enfeitam com luzes coloridas, junto ao presépio…

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

A Anunciação

A Anunciação, por Fra Angelico


“Ao sexto mês, o anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galileia chamada Nazaré, a uma virgem desposada com um homem chamado José, da casa de David, e o nome da Virgem era Maria. Ao entrar em casa dela, o Anjo disse:” Salvé ó cheia de graça, o Senhor está contigo”. Ao ouvir estas palavras, ela perturbou-se e inquiria de si própria o que significava tal saudação. Disse-lhe o Anjo:”Não tenhas receio, Maria, pois achaste graça diante de Deus. Hás-de conceber e dar à luz um filho, ao qual porás o nome de Jesus… (…) Como será isso, se eu não conheço homem? O Anjo respondeu-lhe: O Espírito Santo virá sobre ti e a força do Altíssimo estenderá sobre ti a Sua sombra. (…) Eis aqui a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra…”. Lucas 1, 26 -38.
Este episódio é referido apenas no Evangelho de S. Lucas, e embora seja comemorado a 25 de Março, é com ele que se inicia o ciclo natalício que se estende até à Adoração dos Reis Magos.
Comemorada desde o sec. V no Oriente foi celebrada também no Ocidente a partir do sec. VI. Como os evangelhos são bastante lacónicos no que se refere a pormenores, os artistas recorreram aos evangelhos apócrifos, que situavam Maria a tecer ou junto de uma fonte a tirar água, e cada qual deu asas à sua imaginação na pintura dos detalhes.
Fra Angelico, na sua belíssima Anunciação em 1430-2, que hoje faz parte da colecção de arte do Museu do Prado, inaugurou a tradição italiana de pintar o Anjo e Maria num pórtico, em que a coluna serve para criar um espaço a cada um dos personagens conforme a sua natureza: celestial, a de Gabriel, terrena a da Virgem, vendo-se no canto superior esquerdo a pomba representando o Espírito Santo, que sai das mãos de Deus em direcção a Maria.
Para uma melhor composição plástica do quadro , o pintor incluiu Adão e Eva sendo expulsos do paraíso, pois será Jesus que virá redimir o homem do pecado original.
Mais tarde começou a representar-se a Virgem com um livro nas mãos, provavelmente o da profecia de Isaías, que dizia: “ E uma Virgem conceberá…”, aparecendo algumas vezes um lírio com 3 flores, símbolo de pureza, e porque Maria foi Virgem antes, durante e depois do parto. O Anjo, que primitivamente aparecia de pé, a partir do sec. XII começou a ser apresentado de joelhos, por influência da etiqueta feudal
O Concílio de Trento, que durou de 1545 a 1563, decretou que o Arcanjo Gabriel, dada a grandeza da sua mensagem, devia chegar sobre uma nuvem e acompanhado de um cortejo de anjos.
No quadro de Josefa de Óbidos abaixo apresentado, e que faz parte do Museu Nacional de Arte Antiga, já se podem observar estas disposições
.


Ao saber que Maria estava grávida, José seu marido, que era um homem justo e não queria difamá-la, resolveu deixá-la secretamente. Mas eis que um anjo do Senhor lhe aparece em sonhos, e lhe disse: “José, filho de David, não temas receber Maria, tua esposa, pois o que ela concebeu é obra do Espírito Santo. Ela dará à luz um filho e pôr-lhe-ás o nome de Jesus; porque Ele salvará o povo dos seus pecados”.
Tudo isto sucedeu para que se cumprisse o que foi dito pelo Senhor e anunciado pelo profeta. Mateus, 1, 18-22.

Fontes: Revista Historia Y Vida, nº 441
Bíblia Sagrada – Difusora Bíblica 1978
Servosdarainhawordpress.com
Uc.pt

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Nossa Senhora do Ó



“Por aqueles dias, saiu um édito da parte de César Augusto, para ser recenseada toda a terra. Este recenseamento foi o primeiro que se fez, sendo Quirino governador da Síria. E iam todos recensear-se, cada qual à sua própria cidade. Também José, deixando a cidade de Nazaré, na Galileia, subiu até à Judeia, a cidade de David, chamada Belém, por ser casa e linhagem de David, a fim de recensear-se com Maria, sua mulher, que se encontrava grávida”. Evangelho de S. Lucas.
Sendo assim, Maria, no fim da sua gravidez, teve de enfrentar uma difícil viagem de cerca de 120 Kms., atravessando toda a Palestina, o que, mesmo montada num burrinho, como reza a tradição, lhe deve ter sido extremamente penosa. Se juntarmos a isto o facto de não ter encontrado um abrigo decente, e de ter dado à luz sozinha num palheiro, temos de admitir que os últimos dias da gravidez de Maria não foram nada fáceis para Ela, e justificam plenamente a devoção dedicada à Sua imagem de grávida, pelas mulheres à espera da hora do parto.
De todas as imagens da Virgem, são exactamente as da Senhora do Ó, também chamada de Senhora da Expectação, e da Senhora do Leite, as minhas preferidas, porque A mostram em toda a sua plenitude de Mulher. E essa Mulher está apenas a quatro dias de dar à luz o Seu Filho, tendo apenas um burro e uma vaca para A ajudarem a aquecê-lO nas palhas da manjedoura que lhe servirá de berço!
A 18 de Dezembro celebrou-se a festa de Nossa Senhora do Ó, assim denominada pelo facto de, nas vésperas, se proferirem as antífonas maiores, iniciadas pela exclamação (ou suspiro) “Oh!”.
Esta celebração teve o seu início em Toledo, na Espanha, remontando à época do X Concílio, presidido pelo arcebispo Santo Eugénio, que estipulou que a festa da Anunciação fosse transferida para o dia 18 de Dezembro, (antes era festejada a 8 de Março). Sucedido no cargo por seu sobrinho, Santo Ildefonso, este determinou, por sua vez, que essa festa se celebrasse no mesmo dia, mas com o título de Expectação do Parto da Beatíssima Virgem Maria.
No entanto, o Padre António Vieira, no seu “Sermão de Nossa Senhora do Ó ”, dá-nos a seguinte explicação:
“A figura mais perfeita e mais capaz de quantas inventou a natureza, e conhece a geometria é o círculo. Circular é o globo da terra, circulares as esferas celestes, circular toda esta máquina do universo, que por isso se chama orbe, e até o mesmo Deus, se sendo espírito pudera ter figura, não havia de ter outra, senão a circular. O certo é que as obras sempre se parecem com seu autor; e fechando Deus todas as suas dentro em um círculo, não seria esta ideia natural, se não fora parecida à sua natureza... (…) Estes são os dois maiores círculos que até o dia da Encarnação do Verbo se conheceram; mas hoje nos descreve o Evangelho outro círculo, em seu modo maior. O primeiro círculo, que é o mundo, contém dentro em si todas as coisas criadas; o segundo, incriado e infinito, que é Deus, contém dentro em si o mundo; e este terceiro, que hoje nos revela a fé, contém dentro em si ao mesmo Deus… (…) Nove meses teve dentro em si este círculo a Deus, e quem poderá imaginar que, estando cheio de todo Deus, ainda ali achasse o desejo, capacidade e lugar para formar outro círculo? Assim foi, e este novo círculo, formado pelo desejo, debaixo da figura e nome de O, é o que hoje particularmente celebramos na expectação do parto já concebido: Ecce concipies et paries. De um e outro círculo travados entre si, se comporá o nosso discurso, concordando — que é a maior dificuldade deste dia — o Evangelho com o título da Festa, e o título com o Evangelho. O mistério do Evangelho é a Conceição do Verbo no ventre virginal de Maria Santíssima; o título da Festa é a Expectação do parto e desejos da mesma Senhora, debaixo do nome do O. E porque o O é um círculo, e o ventre virginal outro circulo, o que pretendo mostrar em um e outro é que, assim como o círculo do ventre virginal na Conceição do Verbo foi um O que compreendeu o imenso, assim o O dos desejos da Senhora na expectação do parto foi outro circulo que compreendeu o Eterno...”
“Para Vieira, o mistério da Santíssima Trindade está contido na letra “O”. E o grande milagre que ele celebra neste sermão é a indagação de, como um círculo tão pequeno (o útero de Maria), pôde guardar a vida de um ser tão importante, que é o filho de Deus. Não poderia haver, então, figura mais perfeita para representar o ventre, do que o útero de uma grávida. “Padre António Vieira “Sermão de Nossa Senhora do Ó”.
Em Portugal, o seu culto, bastante difundido, ter-se-ia iniciado em Torres Novas (SANTA MARIA, Frei Agostinho de. Santuário Mariano), onde uma antiga imagem da Senhora era venerada na Capela-mor da Igreja Matriz de Santa Maria do Castelo. Esta imagem era conhecida à época de D. Afonso Henriques por Nossa Senhora de Almonda (devido ao rio Almonda, que banha aquela povoação), à época de D. Sancho I por Nossa Senhora da Alcáçova (c. 1187, por ter sido encontrada numas grutas que o rei mandou escavar para fazer os alicerces do castelo) ou, a partir de 1212, quando se lhe edificou (ou reedificou) a igreja, por Nossa Senhora do Ó. Esta imagem é descrita pelo mesmo autor como:
"É esta santa imagem de pedra mas de singular perfeição. Tem de comprimento seis palmos. No avultado do ventre sagrado se reconhecem as esperanças do parto. Está com a mão esquerda sobre o peito e a direita tem-na estendida. Está cingida com uma correia preta lavrada na mesma pedra e na forma de que usam os filhos de meu padre Santo Agostinho."
A imagem de Nossa Senhora do Ó apresenta a mão esquerda espalmada sobre o ventre avantajado, em fase final de gravidez, mas no Museu de Lamego encontra-se uma imagem do sec. XIV, que tem a mão direita no ventre, ao contrário do que é habitual. A mão direita pode também aparecer em simetria à outra ou levantada. Encontram-se imagens com esta mão segurando um livro aberto ou também uma fonte, ambos significando a fonte da vida. No Museu da Catedral de Santiago de Compostela encontra-se uma Virgem do Ó, possivelmente oferecida pela Rainha Santa Isabel, quando ali se deslocou como peregrina em 1325.
No livro de horas do rei D. Duarte, provavelmente oferecido por sua irmã D. Isabel, duquesa de Borgonha, havia uma iluminura representando a Senhora da Expectação.
No sec. XIX porém, o dogma da Imaculada Conceição afastou dos altares a imagem da Virgem do Ó com o seu ventre proeminente, tão da devoção das gestantes, sendo substituída pela Senhora do Bom Parto, habitualmente vestida de freira e apresentando já o Menino. As imagens afastadas foram enterradas ou vestidas com trajes largos, usando um avental ou escapulário para disfarçar a gravidez, voltando novamente a falar-se delas apenas no sec. XX.

Fontes: www.wikipedia.org
Goulão, Maria José – Arte Portuguesa
www.filologia.or.br.


domingo, 19 de dezembro de 2010

Noite de Natal - L. Caires



Noite de Natal

Tudo são cantos, tudo alacridade:
É noite de Natal, repicam sinos, –
A grande noite em que se entoam hinos,
Enaltecendo a santa caridade.

No degrau duma porta já dormiam
Dois pequeninos, muito abraçadinhos;
O frio era cortante, e os seus bracinhos,
De enregelados, não se desuniam.

Através dessa porta ouve-se o riso.
Lá dentro festejava-se o Natal,
A noite santa, a noite sem igual,
Que às criancinhas traz o paraíso.

Mas essas que vagueiam sem ter pão,
Que dormem sem um tecto protector,
A essas, já sem mãe, sem um amor,
A neve cai-lhes sobre o coração!...

Há quanto aquele sono duraria,
Sabiam-no, talvez, só as estrelas,
Que os pobrezinhos tinham-nas a elas,
E a ninguém mais, naquela noite fria.

A meia-noite acaba de soar,
Nasceu Jesus, o nosso Redentor.
Hinos de graça e divinal amor
Estão no céu os anjos a cantar.

De súbito, uma luz bela e fulgente
Como chuva de estrelas luminosas,
Transforma a branca neve em lindas rosas
E a pedra fria em leito brando e quente.

E, então, naquele berço vaporoso,
No perfume das rosas nacaradas,
As duas cabecinhas desmaiadas
Descansam num remanso misterioso.

Caía a neve em flocos, de mansinho,
Em volta do seu berço encantador,
Estendendo um tapete de esplendor,
Como um manto real de níveo arminho.

Doce visão celeste ajoelhou,
Curvada sobre o berço alvinitente,
E o manto que levava, docemente,
Sobre os dois pezinhos desdobrou.

E o pranto de seus olhos deslizava,
Caindo no seu manto redentor, –
Estrelas deslumbrantes de fulgor
As lágrimas que a Virgem derramava.

Depois, ao envolvê-los nesse manto,
De estrelas fulgurando recamado,
Estreita-os ao seu seio imaculado.
No calor do seu peito sacrossanto.

E os anjos entoando um coro alado,
Em mística doçura celestial,
Cantavam essa noite de Natal,
No céu, de luz divina iluminado:

“A meia-noite acaba de soar, –
Ajoelhai, cristãos! Nasceu Jesus,
Aquele que, pregado numa cruz,
Só por amor de vós veio a expirar.

Nossa Senhora, a Sua Santa Mãe,
Celeste e pura Mãe de abandonados,
Foi socorrer os pobres enjeitados,
Porque essa Mãe nunca enjeitou ninguém.

A Caridade, que Jesus pregou,
Exercê-la, no mundo, mal sabeis!
Vede as crianças, como as esqueceis,
Essas crianças que ele tanto amou.

Bem-vindos sejam nossos irmãozinhos
Que a Virgem Santa à terra foi buscar:
A vida eterna aqui virão gozar,
Porque no céu jamais há pobrezinhos.

Ajoelhai, cristãos, nasceu Jesus!
E Sua Mãe, a Santa Virgem pura,
À terra foi livrar da desventura
Aqueles por quem Deus morreu na cruz.”

E foi assim, em noite abençoada,
À hora Santa em que Jesus nasceu,
Que os pobrezinhos foram para o Céu
No manto azul da Mãe imaculada.

Luthgarda Caires

O Natal dos Hospitais

Luthgarda Caires

Realizado pela 1ª vez em 1944sob a égide do Diário de Notícias, com o propósito de animar os doentes na quadra natalícia, levando-lhes um pouco de alegria e animação, foi transmitido pela RTP em 1958 a partir de um hospital, a que se juntou depois a Philipps, equipando os hospitais do país com televisores para que o programa pudesse ser visto por todos. Em 1963 a Emissora Nacional passou a emitir via Rádio o programa, para que os que não possuíam televisão o pudessem também acompanhar. Foi um sucesso que dura até hoje, e por onde passaram ao longo dos anos praticamente todos os artistas portugueses, desde músicos, cantores, humoristas, os melhores apresentadores, e toda uma equipa que trabalhando nos bastidores se associaram sempre a esta festa de solidariedade e fraternidade.
O que provavelmente nem todas as pessoas sabem é que esta celebração tem a sua origem na dor imensa de uma mãe pela perda da sua filha ainda criança…
Escritora, poetisa e filantropa, Lutgarda ou Luthgarda Guimarães de Caires, nasceu em 1871, em Vila Real de Santo António, perdendo muito cedo a sua mãe. Educada junto com os seus irmãos com muita ternura e esmero por seu pai, veio mais tarde para Lisboa, onde casou com o advogado madeirense João de Caires, homem culto, escritor e fundador da Sociedade de Propaganda de Portugal.
Em 1905 começa a colaborar em jornais com artigos de índole social e em 1911 a pedido do ministro da Justiça, apresenta propostas para a melhoria da condição dos presos nas cadeias portuguesas, que na altura eram mistas, estando as mulheres numa situação extremamente crítica, tanto física como psicologicamente.
Insurge-se também contra o facto das mulheres cultas e diplomadas serem excluídas dos cargos públicos, assim como da desigualdade da lei em relação aos cônjuges no que respeita ao direito de alienação dos bens do casal, e da urgente necessidade da instrução da mulher.
Ainda em Lisboa, sofre o desgosto de perder uma filha ainda criança, o que a marca profundamente. Para aliviar um pouco a dor sofrida, dedicou-se a visitar as crianças do Hospital D. Estefânia, levando-lhes roupas que ela própria fazia, rebuçados e brinquedos, conseguindo o apoio das suas amigas para esta obra, que tinha no Natal uma distribuição maior. Parte do lucro que auferia com a venda dos seus livros destinava-se a este fim. Não se cansava de percorrer a cidade à procura do último desejo dos seus doentinhos à beira da morte. A sua obra acabou por se generalizar a todas as crianças dos outros hospitais de Lisboa.
Durante dez anos, Lutgarda Caires foi a grande impulsionadora do Natal das Crianças dos Hospitais, que mais tarde se estendeu a todas as idades e passou a chamar-se apenas pelo nome porque hoje o conhecemos:“O Natal dos Hospitais”.
Fez o libreto da ópera Vagamundo, com música de Rui Coelho, que foi levada à cena em 1914, e depois em 1931, com música de D. Júlia Oceana Pereira, a favor dos Hospitais de Trás-os-Montes e do Asilo de Cegos António Feliciano de Castilho. Promoveu um sarau literário e musical no salão da Ilustração Portuguesa, em 1909, em benefício das vítimas do terramoto de Benavente.
Em 1923, Lutgarda de Caires, ganhou o 1° prémio nos Jogos Florais Hispano-Portugueses de Ceuta, com o soneto Florinha da Rua. Ausente em França, fez-se representar pelo irmão na cerimónia que teve lugar no mosteiro do Carmo, e onde uma delegação espanhola se deslocou propositadamente para fazer a entrega não só do diploma, mas também do prémio, oferecido pelo rei de Espanha.
A sua obra, essencialmente poética, está publicada em livros como “Glicínias” – 1910, “Bandeira Portuguesa” – 1910, “A Dança do Destino, contos” – 1911, “Papoilas” – 1912, “Pombas Feridas” – 1914, “Sombras e Cinzas” – 1916, dedicado a sua filha, “Violetas” – 1922, entre vários outros.
Foi agraciada com a Ordem de Benemerência e com a Comenda da Ordem de Sant’Iago. Falece em Lisboa em 1935.
A seguir transcrevo um poema de Luthgarda Caires intitulado “ Noite de Natal”.

Fontes: Oliveira, Américo Lopes – Dicionário de Mulheres Célebres
Leme.pt/biografias

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

O Suave Milagre

Nesse tempo Jesus ainda se não afastara da Galileia e das doces, luminosas margens do lago de Tiberíade – mas a nova dos seus milagres penetrara já até Enganim, cidade rica, de muralhas fortes, entre olivais e vinhedos, no país de Issacar.
Uma tarde um homem de olhos ardentes e deslumbrados passou no fresco vale, e anunciou que um novo profeta, um Rabi formoso, percorria os campos e as aldeias da Galileia, predizendo a chegada do Reino de Deus, curando todos os males humanos. E, enquanto descansava, sentado à beira da Fonte dos Vergéis, contou ainda que esse Rabi, na estrada de Magdala, sarara da lepra o servo de um decurião romano, só com estender sobre ele a sombra das suas mãos; e que noutra manhã, atravessando numa barca para a terra dos Gerasenos, onde começava a colheita do bálsamo, ressuscitara a filha de Jairo, homem considerável e douto que comentava os livros na sinagoga.
Ora entre Enganim e Cesareia, num casebre desgarrado, sumido na prega de um cerro, vivia a esse tempo uma viúva, mais desgraçada mulher que todas mulheres de Israel. O seu filhinho único, todo aleijado, passara do magro peito a que ela o criara para os farrapos de enxerga apodrecida, onde jazera, sete anos passados, mirrando e gemendo. Também a ela a doença a engelhara dentro dos trapos nunca mudados, mais escura e torcida que uma cepa arrancada. E, sobre ambos espessamente a miséria cresceu como o bolor sobre cacos perdidos num ermo. Até na lâmpada de barro vermelho secara há muito o azeite. Dentro da arca pintada não restava grão ou côdea. No Estio, sem pasto, a cabra morrera. Depois, no quinteiro, secara a figueira. Tão longe do povoado, nunca esmola de pão ou mel entrava o portal. E só ervas apanhadas nas fendas das rochas, cozidas sem sal, nutriam aquelas criaturas de Deus na Terra Escolhida, onde até às aves maléficas sobrava o sustento!
Um dia um mendigo entrou no casebre, repartiu do seu farnel com a mãe amargurada, e um momento sentado na pedra da lareira, coçando as feridas das pernas, contou dessa grande esperança dos tristes, esse Rabi que aparecera na Galileia, e de um pão no mesmo cesto fazia sete, e amava todas as criancinhas, e enxugava todos os prantos, e prometia aos pobres um grande e luminoso reino, de abundância maior que a corte de Salomão. A mulher escutava, com olhos famintos. E esse doce Rabi, esperança dos tristes, onde se encontrava? O mendigo suspirou. Ah esse doce Rabi! quantos O desejavam, que se desesperançavam! A sua fama andava por sobre toda a Judeia, como o sol que até por qualquer velho muro se estende e se goza; mas para enxergar a claridade do seu rosto, só aqueles ditosos que o seu desejo escolhia. Obed, tão rico, mandara os seus servos por toda a Galileia para que procurassem Jesus, O chamassem com promessas a Enganim; Sétimo, tão soberano, destacara os seus soldados até à costa do mar, para que buscassem Jesus, O conduzissem, por seu mando a Cesareia. Errando esmolando por tantas estradas, ele topara os servos de Obed, depois os legionários de Sétimo. E todos voltavam, como derrotados, com as sandálias rotas sem ter descoberto em que mata ou cidade, em que toca ou palácio, se escondia Jesus.
A tarde caía. O mendigo apanhou o seu bordão, desceu pelo duro trilho, entre a urze e a rocha. A mãe retomou o seu canto mais vergada, mais abandonada. E então o filhinho, num murmúrio mais débil que o roçar de uma asa, pediu à mãe que lhe trouxesse esse Rabi que amava as criancinhas, ainda as mais pobres, sarava os males ainda os mais antigos. A mãe apertou a cabeça esguedelhada:
– Oh filho e como queres que te deixe, e me meta aos caminhos à procura do Rabi da Galileia? Obed é rico e tem servos, e debalde buscaram Jesus, por areais e colinas, desde Corazim até ao país de Moab. Sétimo é forte e tem soldados, e debalde correram por Jesus, desde o Hébron até ao mar! Como queres que te deixe! Jesus anda por muito longe e a nossa dor mora connosco, dentro destas paredes, e dentro delas nos prende. E mesmo que O encontrasse, como convenceria eu o Rabi tão desejado, por quem ricos e fortes suspiram, a que descesse através das cidades até este ermo, para sarar um entrevadinho tão pobre, sobre enxerga tão rota?
A criança, com duas longas lágrimas na face magrinha, murmurou:
– Oh mãe! Jesus ama todos os pequeninos. E eu ainda tão pequeno, e com um mal tão pesado, e que tanto queria sarar!
E a mãe, em soluços:
– Oh meu filho, como te posso deixar? Longas são as estradas da Galileia, e curta a piedade dos homens. Tão rota, tão trôpega, tão triste, até os cães me ladrariam da porta dos casais. Ninguém atenderia o meu recado, e me apontaria a morada do doce Rabi. Oh filho! Talvez Jesus morresse... Nem mesmo os ricos e os fortes O encontram. O Céu O trouxe, o Céu O levou. E com ele para sempre morreu a esperança dos tristes.
De entre os negros trapos, erguendo as suas pobres mãozinhas que tremiam, a criança murmurou:
– Mãe, eu queria ver Jesus…
E logo, abrindo devagar a porta e sorrindo, Jesus disse à criança:
– Aqui estou.

Conto de Eça de Queiroz
Adaptação

domingo, 12 de dezembro de 2010

Tom Jobim

8 /12/1994

Garota de Ipanema

Olha que coisa mais linda
Mais cheia de graça
é ela menina,
que vem e que passa
Num doce balanço
a caminho do mar

Moça do corpo dourado
Do sol de Ipanema
O seu balançado é mais que um poema
é a coisa mais linda que já vi passar

Ai! Como estou tão sozinho
Ai! Como tudo é tão triste
Ai! A beleza que existe
A beleza que não é só minha
E também passa sozinha

Ai! Se ela soubesse
que quando ela passa
O mundo inteirinho
se enche de graça
E fica mais lindo por causa do amor

Só por causa do amor...

A letra original da canção, escrita por Vinicius e recusada por Tom era:
Menina que passa

Vinha cansado de tudo
De tantos caminhos
Tão sem poesia
Tão sem passarinhos
Com medo da vida
Com medo de amar
Quando na tarde vazia
Tão linda no espaço
Eu vi a menina
Que vinha num passo
Cheio de balanço
Caminho do mar

Fonte: Wikipédia

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Florbela Espanca

Florbela em desenho feito por seu irmão Apeles
Autora de poemas, artigos na imprensa, traduções, epístolas e um diário, Florbela Espanca antes de tudo foi poetisa. A sua Poesia é de uma imensa intensidade lírica e profundo erotismo. O sofrimento, a solidão, a saudade, o desencanto, o desejo e a morte aliados a uma imensa ternura e a um desejo de felicidade constituem a temática veiculada pela veemência passional da sua linguagem. Transbordando a convulsão interior da poetisa pela natureza, a paisagem da charneca alentejana está presente em muitas das suas imagens e poemas.
Tida como a grande figura feminina das primeiras décadas da literatura do sec. XX, Florbela Espanca não se liga claramente a qualquer movimento literário. Próxima do neo-romantismo e de certos poetas de fim de século, pelo carácter confessional e sentimentalista da sua obra, segue a poética de António Nobre, facto reconhecido pela poetisa. Por outro lado, a técnica do soneto, que a celebrizou, pode considerar-se influência de Antero de Quental e também de Camões.
Baptizada com o nome Flor Bela de Alma da Conceição, nasceu no dia 8 de Dezembro de 1894 em Vila Viçosa, no Alentejo, filha de João Maria Espanca e de Antónia da Conceição Lobo, de condição humilde. Tanto ela como o seu irmão Apeles 3 anos mais novo, foram registados como filhos ilegítimos de pai incógnito. Seu pai era casado com Mariana do Carmo Toscano, que não lhe pôde dar filhos, passando a ser madrinha de baptismo das crianças, criando-as em sua casa. João Maria nunca lhes recusou apoio nem carinho paternal, mas só reconheceu Florbela como a sua filha em cartório, dezoito anos depois da morte dela, por altura da inauguração do seu busto em Évora, debaixo de cerrada insistência de um grupo de florbelianos.
O seu pai herdou a profissão do sapateiro, mas passou a trabalhar como antiquário, negociante de cabedais, desenhista, pintor, fotógrafo, sendo um dos introdutores do “Vitascópio de Edison” em Portugal.
Estudou no liceu de Évora, mas só depois do seu casamento em 1913 com Alberto Moutinho, é que em 1917, conclui a secção de Letras do Curso dos Liceus e se matricula em Outubro na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Foi uma das catorze mulheres entre trezentos e quarenta e sete alunos inscritos. Colabora com jornais e revistas, entre os quais o “Portugal Feminino”, e em 1921, no terceiro ano de Direito, publica o seu primeiro livro de poesia “Livro de Mágoas”.
Nesse mesmo ano divorcia-se de Alberto Moutinho de quem já vivia separada há uns anos, casando-se no Porto com o oficial de artilharia António Guimarães. Em 1923, separa-se novamente e casa com o médico Mário Laje, em Matosinhos. Nesse mesmo ano publica o seu livro de poemas “O Livro de Soror Saudade”.
Os casamentos falhados, assim como as desilusões amorosas em geral, o ostracismo a que muitas vezes era sujeita, e principalmente a morte do seu irmão, Apeles Espanca, num acidente de avião em 1927 e a quem estava ligada por fortes laços afectivos, marcaram profundamente a sua vida e a sua obra, contribuindo também para o agravamento da sua saúde, principalmente a do foro psicológico.
A 8 de Dezembro de 1930, dia do seu 36º aniversário, e após ter-lhe sido diagnosticado um edema pulmonar, Florbela Espanca põe termo à vida.
A maior parte da sua obra é publicada postumamente. Charneca em Flor (1930), Cartas de Florbela Espanca, por Guido Battell (1930), Juvenília (1930), As Máscaras do Destino, contos (1931), Diário do Último Ano Seguido de Um Poema Sem Título (1981) e Dominó Preto ou Dominó Negro, contos (1982).

Fontes: Wikipédia
Enciclopédia de “O Público”, vol.29
Eu

Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada... a dolorida...

Sombra de névoa ténue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...

Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê...

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Nossa Senhora da Conceição

Padroeira de Portugal

Celebra-se hoje o dia da Imaculada Conceição da Virgem Maria, também conhecida por Nossa Senhora da Conceição, cuja festa foi instituída em 1476 pelo Papa Sisto IV e confirmada em 1570 pelo Concílio de Trento. Pio V formaliza-a nesse mesmo ano através do novo Ofício e em 1708, Clemente XI tornou-a obrigatória para toda a cristandade.
A 8 de Dezembro de 1854, Pio IX, na Bula Ineffabilis Deus, define assim o dogma da Imaculada Conceição de Maria:
“Em honra da santa e indivisa Trindade, para decoro e ornamento da Virgem Mãe de Deus, para exaltação da fé católica, e para incremento da religião cristã, com a autoridade de Nosso Senhor Jesus Cristo, dos bem-aventurados Apóstolos Pedro e Paulo, e com a nossa, declaramos, pronunciamos e definimos a doutrina que sustenta que a beatíssima Virgem Maria, no primeiro instante da sua concepção, por singular graça e privilégio de Deus omnipotente, em vista dos méritos de Jesus Cristo, Salvador do género humano, foi preservada imune de toda mancha de pecado original, essa doutrina foi revelada por Deus e, portanto, deve ser sólida e constantemente crida por todos os fiéis”.
A 8 de Setembro de 1953, Pio XII através da Carta encíclica Fulgens corona anunciou a celebração do "Ano Mariano" comemorativo do primeiro centenário da definição do dogma da "Imaculada Conceição da Bem-aventurada Virgem Maria".
Este tema deu origem a numerosos debates e discussões teológicas durante séculos, principalmente entre franciscanos e dominicanos, nem todos aceitando a ideia de que Maria fosse concebida sem o pecado original. S. Tomás de Aquino e S. Bernardo jamais a admitiram, ao contrário de Santo Agostinho e Santo Irineu, entre outros, que defendiam que Maria estaria isenta do pecado por intervenção sobrenatural de Deus, para poder ser a Mãe de Jesus. Este dogma não é aceite tanto pelas Igrejas Ortodoxas como pelas Protestantes.
Na arte as primeiras imagens aparecem nos finais da Idade Média, ao principio com a Virgem acompanhada de Santa Ana e São Joaquim, e depois já com os atributos próprios da sua devoção: o manto azul e o vestido branco, a lua em crescente e a serpente rodeando o globo.
É padroeira de vários países, como os Estados Unidos e Espanha entre outros. Em Portugal, o rei D. João IV depois da Revolução de 1640, em agradecimento, declara-a padroeira do reino:
“Considerando que o senhor Rei D. Afonso Henriques (...) tomou por especial Advogada sua a Virgem Mãe de Deus, e debaixo da sua sagrada protecção e amparo lhe ofereceu a todos os seus sucessores, Reinos e Vassalos (...) reconhecendo ainda em mim avantajadas e contínuas mercês e benefícios da liberal e poderosa mão de Deus, Nosso Senhor, por intercessão da Virgem N. Sr.ª da Conceição: estando ora junto em Cortes com os três Estados, lhes fiz propor a obrigação de renovar e continuar esta promessa, e venerar com muito particular afecto e solenidade a festa da Imaculada Conceição. E nelas com o parecer de todos, assentamos de tomar por Padroeira de nossos Reinos e Senhorios a Santíssima Virgem Nossa Senhora da Conceição, (...) sita em Vila Viçosa e prometemos e juramos (...) de confessar e defender sempre (até dar a vida, se necessário) que a Virgem Maria, Mãe de Deus foi concebida sem pecado original (...) obrigando-me a haver confirmação da Santa Sé Apostólica”.
“Se alguma pessoa intentar contra esta nossa promessa, juramento e vassalagem, por este mesmo efeito, sendo vassalo, o havemos por não natural e queremos que seja logo lançado fora do Reino; se fôr Rei, haja a sua e nossa maldição e não se conte entre nossos descendentes, esperando que pelo mesmo Deus que nos deu o Reino e subiu à dignidade real, seja dela abatido e despojado. Para que em todo o tempo haja a certeza desta nossa Eleição, promessa e juramento, firmada e estabelecida em Cortes, mandamos fazer dela três autos públicos, um que vai ser levado de imediato à Corte de Roma para se expedir a confirmação da Santa Sé Apostólica, outro que se juntará a esta confirmação, e o terceiro com cópia se guarde no Cartório da Caza de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa e na nossa Torre do Tombo - Lisboa, aos 25 de Março de 1646; Baltazar Roiz Coelho, o fez; Pedro Vieira da Silva, o escreveu.”
Depondo a coroa real aos pés da imagem, o rei prometeu-lhe também, em seu nome e dos seus sucessores, o tributo anual de 50 cruzados de ouro, ordenando que os estudantes da Universidade de Coimbra, antes de tomarem qualquer grau, jurassem defender a Imaculada Conceição da Mãe de Deus. Desde esta altura, nunca mais um soberano português usou a coroa na cabeça, e nos retratos oficiais esta repousa ao lado dos monarcas. No entanto, a confirmação papal demorou 25
anos a chegar, sendo concedida pelo Papa Clemente X, apenas em 1671.

moedas conceição


D. João IV não foi o primeiro rei de Portugal que colocou o reino sob a protecção de Nossa Senhora, visto que já D. Afonso Henriques, cinco séculos antes, tinha feito um voto solene, apenas tornou permanente uma devoção a que os nossos monarcas se acolheram em momentos críticos para o país. Para comemorar este facto, mandou cunhar uma das nossas mais belas moedas de sempre, a famosa moeda Conceição, primitivamente uma medalha, mas que a partir de 1650 foi mandada lavrar como moeda de ouro e prata, com o valor de 12$000 e 600 reis respectivamente. No anverso vêm-se as armas do Reino sobre a Cruz de Cristo e coroadas, rodeadas pelos títulos de D. João IV. No reverso vê-se a imagem de N. Sra. da Conceição de frente, coroada por sete estrelas, e cercada pelos atributos pelos quais a Igreja a invoca: de pé sobre a meia-lua que se sobrepõe ao globo no qual se enrosca uma serpente, à direita, o espelho, a arca do santuário e a fonte selada; à esquerda, o sol, a casa de ouro e o horto cerrado.
Em 1818, o rei D. João VI instituiu a Ordem Militar de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa, como agradecimento por Portugal ter sobrevivido às invasões francesas de Napoleão Bonaparte.
A imagem da Padroeira, em pedra de ançã, encontra-se no altar-mor do Santuário de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa, que foi construído exactamente no local onde se erguia uma ermida gótica consagrada a Nossa Senhora do Castelo, fundada por D. Nuno Álvares Pereira. Diz a tradição que a imagem teria vindo de Inglaterra a pedido do próprio Condestável que, nos finais do sec. XIV fez consagrar esta igreja a Nossa Senhora da Conceição. A Senhora costuma estar tradicionalmente vestida com trajes oferecidos pelas rainhas portuguesas.

Virgem da Conceição - Murillo


Fontes:wikipédia.org
Saraiva, José Hermano - História de Portugal
www.cm-vilavicosa.pt

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

1º Dezembro 1640 - II

D. João IV

Ouvindo os tiros, acudiu António Correia, oficial-mor da Secretaria de Estado, que D. António Telo prostrou com uma punhalada. Julgando-o morto seguiram em frente, mas embora ferido conseguiu escapar. Também o capitão Diogo Garcia Palhez, ao ver que ia ser atacado, saltou de uma janela para o pátio partindo uma perna mas salvando a vida.
Avisado do que se passava, Miguel de Vasconcelos saltou da cama, vestindo-se à pressa e trancando por dentro a porta do quarto. Ao ouvir os machados que tentavam arrombar o batente, acabou por esconder-se num armário de papéis. Quando a porta se desfez, os conjurados irromperam pelo quarto e não o vendo, preparavam-se já para sair, quando um leve rumor provocado por algum movimento do perseguido os alertou. (Diz a tradição que foi uma escrava negra, para se vingar dos maus tratos, que apontou o armário). Descarregaram então as suas pistolas contra o armário, onde duas balas lhe atravessaram a garganta e abandonaram-no a esvair-se em sangue, porque tinham mais tarefas a fazer. Um outro grupo chefiado por D. Gastão Coutinho ao ver o corpo caído no chão, agarrou nele em peso atirando-o ainda com vida através de uma janela para o terreiro, onde a populaça cevou nele toda a sua fúria.
Alarmada, a duquesa de Mântua correu a uma das janelas que deitava para o pátio e gritou para o povo que enchia o terreiro, em atitude ameaçadora:
- Que é isto, Portugueses? Onde está a vossa lealdade?
Respondeu-lhe um rugido do leão popular. Teve a percepção de que estava perdida, mas não lhe faltou ânimo para defrontar os revoltosos que acabavam de entrar nos seus aposentos. Insistindo em aconselhar sossego, prometeu o perdão de el-rei para todos, mas estes responderam-lhe que apenas reconheciam um soberano, que era D. João IV. E D. Carlos de Noronha pediu-lhe que se mostrasse mais prudente e não os obrigasse ao extremo de lhes faltarem ao respeito.
- A mim? Como? – perguntou altivamente a duquesa.
- Obrigando Vossa Alteza, se não quiser entrar por esta porta, a sair por aquela janela – respondeu o fidalgo.
Ostentando um ar majestoso, a duquesa retirou-se, recolhendo aos seus aposentos, onde ficou prisioneira.
A notícia da prisão da duquesa de Mântua difundiu-se rapidamente por toda a cidade e as ruas e praças encheram-se de uma multidão enorme dando vivas a “el-rei D. João IV”. A revolução estalou tão pronta e venceu tão repentina que os funcionários entrados naquele dia nas repartições para funcionarem em nome de Filipe IV continuaram a despachar em nome de D. João IV.

Texto adaptado de: A Revolução de 1640, por Mário Domingues

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

1º de Dezembro de 1640 – I



Na noite de 30 de Novembro, uma sexta-feira, celebrou-se no palácio de D. Antão de Almada, a última reunião dos conspiradores. Eram vésperas do grande dia. Dentro de poucas horas, um punhado de audaciosos jogaria o seu destino e o da nação. Vivia-se febrilmente. “ Uns faziam testamento, outros encomendavam missas aos religiosos, e nenhum hesitava já. Nessa tarde, alguns homens do povo, mais influentes, haviam afirmado aos nobres que toda a Lisboa responderia ao grito de liberdade. Nessa última reunião aprazou-se tudo definitivamente: que às nove horas se juntariam no Terreiro do Paço; que uns acometeriam a guarda castelhana, outros a tudesca ou alemã; que em seguida correriam uns à janela a aclamar o duque d e Bragança, outros aos aposentos de Miguel de Vasconcelos para o matarem. Depois separaram-se. A noite estava carregada e triste. Era a última noite de escravidão.” Pinheiro Chagas.
Foi de inquietação essa noite, não só nos solares das famílias nobres avisadas da conjura, mas também nos bairros humildes onde muitos homens do povo, principalmente aqueles a que hoje chamaríamos de “chefes de fila”, aguardavam o sinal de arrastar a multidão a colaborar no golpe combinado.
Duas mulheres se destacaram: D. Filipa de Vilhena entregou as espadas a seus filhos D. Jerónimo de Ataíde e D. Francisco Coutinho, ambos ainda muito novos, pouco mais do que crianças, exortando-os a cumprir o seu dever para com a pátria. O mesmo fez D. Mariana de Lencastre com seus filhos António Teles e Fernão Teles da Silva.
O sol do dia 1º de Dezembro de 1640 não tardaria a raiar.
A manhã de sábado, ao contrário do que costuma suceder nesta estação do ano, surgiu clara, sem nuvens no azul cetinoso do céu, permitindo que o Sol brilhasse tão vivamente como num dia de Agosto. Consoante o plano estabelecido, manhã cedo, começaram a afluir ao terreiro do Paço os revolucionários, em pequenos ranchos para não despertarem suspeitas, ocultando as armas debaixo das grandes capas em moda nesse tempo, nas quais se embuçavam como se apenas quisessem resguardar-se do frio. Os fidalgos iniciados no segredo da conjura e os convidados de última hora apresentavam-se placidamente em ar de descuidoso passeio como Pinto Ribeiro lhes recomendara. Alguns nobres vinham de coche, outros a cavalo.
A aparência pacífica dos coches, que iam chegando ao terreiro do Paço não assustava os soldados da guarda, acostumados a verem a aparecer junto do palácio os cortesãos da duquesa. O povo também ainda não se acumulara em grandes quantidades. Todos esperavam com ansiedade o toque das nove horas.
Assim que a hora soou o grosso dos conjurados sobe rapidamente as escadas, entra na sala dos archeiros tudescos e, sem lhes darem tempo nem sequer a suspeitarem o que iria suceder, deitam ao chão os cabides das alabardas enquanto outros desembainhando a espada afugentam os archeiros atónitos e desarmados. Alguns ainda oferecem resistência, mas sem sucesso. É então que D. Miguel de Almeida, com toda a vivacidade dos seus oitenta anos, corre a uma varanda, abre-a e, brandindo um estoque, exclama:
- Liberdade! Liberdade! Viva el-rei D. João IV! O duque de Bragança é o nosso legítimo rei!
Respondeu-lhe debaixo um imenso grito de entusiasmo e júbilo:
- Liberdade! Liberdade! – brada o povo, num grito uníssono.
Assim que a multidão respondeu aos gritos dos conjurados, os restantes que ainda aguardavam nos coches o sinal de intervir, arremessaram-se contra a guarda castelhana, antes que esta se refizesse da surpresa que lhe causaram aqueles gritos intempestivos. Pouco tempo resistiram os castelhanos que foram completamente dispersados.
Vencido o obstáculo da guarda correram a juntar-se aos restantes conjurados que já seguiam em frente. D. António Telo jurara que seria o primeiro a haver-se com Miguel de Vasconcelos e com mais alguns dirigiram-se para os seus aposentos encontrando no caminho o corregedor Francisco Soares de Albergaria. Gritaram-lhe:
- Viva el-rei D. João IV!
Respondeu, fanfarrão:
- Viva el-rei D. Filipe!
Ainda não acabara e já duas balas o calavam para sempre.

Texto adaptado de: A Revolução de 1640, por Mário Domingues