Diz Samuel Noah Kramer e muito bem,
que a História começa na Suméria, mas a poesia amorosa também…
Ao contrário da poética narrativa e
glorificadora de que se conhecem bastantes excertos, da poesia lírica apenas se
conheçam dois poemas, encontrados por acaso no Museu da Antiguidade Oriental de
Istambul, aproximadamente no fim do ano de 1951, por Muazzez Cig, um dos
conservadores turcos da colecção de placas literárias sumérias guardadas em
gavetas naquele museu.
Numa delas, a placa 2461 atraiu-lhe
a atenção pelo bom estado de conservação em que se encontrava e ao estudá-la
percebeu que tinha diante de si um dos mais antigos poemas de amor alguma vez
escrito por mãos humanas…
Através dos tempos, a voz de uma
jovem noiva convida o seu amado a entregar-se às suas carícias durante uma
noite de amor na casa de ambos…
Carregado de sensualidade, este
cântico de amor erótico, mas não profano, era recitado durante a celebração das bodas sagradas do casal divino (o
aikitu), na festa do Ano Novo, a maior solenidade cíclica dos sumérios,
aparentemente consumados na prática pelo rei e uma das sacerdotisas da deusa
Inana, com a finalidade da perpetuação da fecundidade universal.
Nesta festa, celebrada no início da
Primavera e provavelmente no início do Outono e que durava vários dias
obedecendo a um ritual detalhado e preciso, era à sacerdotisa escolhida para
representar a noiva divina entre as várias que serviam no templo da principal
deusa do panteão sumério que cabia o dever de declamar este hino dedicado ao
noivo real, neste caso, o rei Shushin, um monarca sumério que reinou em Ur
entre 2038 e 2030 a.C.
POEMA AO REI SHUSHIN
Noivo, caro ao meu coração,
Agradável é a tua beleza, doce mel,
Leão, caro ao meu coração,
Agradável é a tua beleza, doce mel.
Tu cativaste-me, deixa-me permanecer
tremente perante ti,
Noivo, eu deixaria que me levasses
para o quarto,
Tu cativaste-me, deixa-me permanecer
tremente perante ti,
Leão, eu deixaria que me levasses
para o quarto.
Noivo, deixa que te acaricie,
A minha preciosa carícia é mais
saborosa do que o mel,
No quarto o mel corre,
Desfrutamos a tua agradável beleza.
Leão, deixa-me acariciar-te,
A minha preciosa carícia é mais
saborosa do que o mel.
Noivo, tu de mim tomaste o teu
prazer,
Diz à minha mãe, ela far-te-á
gentilezas,
O meu pai, ele dar-te-á presentes.
O teu espírito, eu sei onde recrear
o teu espírito,
Noivo, dorme na nossa casa até ao
amanhecer,
O teu coração, eu sei como alegrar o
teu coração,
Leão, durmamos juntos em nossa casa
até ao amanhecer.
Tu, porque me amas,
Dá-me o favor das tuas carícias,
Meu senhor deus, meu senhor
protetor,
Meu Shu-Sin que alegra o coração de
Enlil,
Dá-me o favor das tuas carícias.
Teu lugar agradável como mel, por
favor estende
a tua mão sobre ele,
Traz a tua mão sobre ele como um
manto gishban
Cola a tua mão como uma taça sobre
ele como um traje gishban-sikin.
Fontes:
Kramer, Samuel Noah – A História
começa na Suméria
História Universal vol.1
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