sábado, 25 de agosto de 2012

Poemas – Pablo Neruda

 
Poema XXV
Antes de amar-te, amor, eu nada tinha:
vacilei pelas ruas e pelas coisas:
nada contava nem tinha nome:
o mundo era do ar que aguardava.
 
Conheci salões cinzentos,
túneis habitados pela lua,
hangares cruéis que se despediam,
perguntas que teimavam sobre a areia.
 
Tudo estava vazio, morto e mudo,
caído, abandonado e abatido,
tudo era inalienavelmente alheio,
 
Tudo era dos outros e de ninguém,
até que a tua beleza e a tua pobreza
encheram o Outono de presentes
 - // -
 Antes de amarte, amor, nada era mío:
vacilé por las calles y las cosas:
nada contaba ni tenía nombre:
el mundo era del aire que esperaba.

Yo conocí salones cenicientos,
túneles habitados por la luna,
hangares crueles que se despedían,
preguntas que insistían en la arena.

Todo estaba vacío, muerto y mudo,
caído, abandonado y decaído,
todo era inalienablemente ajeno,

todo era de los otros y de nadie,
hasta que tu belleza y tu pobreza
llenaron el otoño de regalos.

Cem Sonetos de Amor – Pablo Neruda
 


terça-feira, 21 de agosto de 2012

A Viagem de Bartolomeu Dias – II



…Como lhes pareceram hostis, os navegadores continuaram para leste, entrando numa baía a que puseram o nome de Aguada de S. Brás, por ser dia 3 de Fevereiro, onde desembarcaram e se abasteceram de água fresca. É a actual Mossel Bay (Baía dos Mexilhões). Sem se aperceberem disso, tinham dobrado a África.

Seguindo viagem, foram cartografando todos os pontos de interesse, como o Cabo Talhado e o Golfo dos Pastores (actuais Cape Seal e St. Francis Bay), o Cabo da Roca (Cape Recife) e a Angra da Alagoa (Algoa Bay), tão extensa que nela acharam os ilhéus de Santa Cruz primeiro e os Chãos mais à frente (St. Croix e Bird Islands).

Aqui, Bartolomeu Dias teve de ceder à pressão de toda a tripulação que queria regressar à pátria. Há cerca de sete meses que navegavam, tendo já ultrapassado em 350 léguas a anterior expedição de Diogo Cão, sem que descobrissem a passagem para o Índico! È certo que tinham desfeito o mito do terrível Atlântico… Não havia águas ferventes, nem monstros com cabeça de cão, ou sem cabeça e com os olhos na barriga… Nem tinham caído no precipício que havia no fim desse mar, porque nada mais havia para além dele! Mas estavam fartos e cansados, com falta de vitaminas, além de que não se via nada onde pudessem fazer aguada… Embora contrariado, aceitou, pedindo apenas mais três dias de navegação, o que lhe foi concedido.

Continuando, a 12 de Março levantaram o 1º padrão num rochedo a que primeiro chamaram de Ilhéu Falso (False Island), mas a que depois chamaram de Ilhéu da Cruz ou Penedo das Fontes. O padrão S. Gregório (assim chamado por ser o nome do santo desse dia) tinha o escudo de armas de Portugal, de um lado, e dos outros, três inscrições em português, latim e arábico:

“Era da criação do mundo de 6686 e de Cristo de 1487, o excelente esclarecido Rei Dom João Segundo de Portugal mandou descobrir esta terra e poer este padrão por Bartholomeu Diaz, escudeiro de sua casa”.

Chegaram, por fim, à foz de um rio, a que deram o nome de Rio do Infante (actual Great Fish River, por ser João Infante o primeiro a vê-lo), e, tendo acabado o prazo concedido ao capitão sem nada avistarem de notável, começaram a viagem de regresso, mas pela linha da costa para oeste, fazendo primeiro uma paragem no Ilhéu da Cruz de onde, segundo João de Barros, Bartolomeu Dias” se afastou com tanta dor e sofrimento como se ali deixara um filho desterrado”.

E foi na torna-viagem que o milagre se deu!

Navegando sempre com o continente à vista, a 16 de Maio contornaram um cabo a que deram o nome de Ponta de S. Brandão, depois Cabo das Agulhas, porque as agulhas de marear não tinham qualquer variação magnética e onde começaram a apanhar ventos fortes e ondas altíssimas. Sem o saberem, tinham alcançado o verdadeiro extremo sul do continente africano onde os dois oceanos se encontram…desfazendo a ideia ptolemaica de que o Índico era um mar interior cercado de terra por todos os lados!

A 6 de Junho avistaram um profundo Golfo dentro das Serras, formando uma enseada cuja ponta ocidental era um enorme promontório que iniciava a curva da costa flectindo para norte…

"Partidos dali, houveram vista daquele grande e notável cabo, ao qual por causa dos perigos e tormentas em o dobrar lhe puseram o nome de Tormentoso, mas el-rei D. João II lhe chamou cabo da Boa Esperança, por aquilo que prometia para o descobrimento da Índia tão desejada."

Estava enfim vencido o terrível Adamastor, o poderoso gigante que guardava as terras do fim do mundo! Tinha sido descoberta a passagem de sueste que abria o Caminho Marítimo para a Índia, a Agensiba de Ptolomeu!

Nessa enseada, a actual False Bay, levantaram o 2º padrão, o de S. Filipe. A partir dali, ora com ventos favoráveis ou enfrentando mares revoltos, chegaram a 24 de Julho à actual Luderitz Bay, a que chamou Golfo de S. Gregório, onde possivelmente deixou outro padrão.

Ao fazerem escala na Baía dos Tigres, onde nove meses antes tinham deixado a naveta dos mantimentos, quedaram estarrecidos…Dos nove homens que tinham ficado ali, apenas três sobreviviam, autênticos farrapos humanos! E para piorar a situação, um deles, com a alegria de os voltar a ver, faleceu…


quarta-feira, 8 de agosto de 2012

A Viagem de Bartolomeu Dias



Embora Vasco da Gama tenha sido o primeiro português a atingir a Índia com as suas caravelas, foi Bartolomeu Dias o verdadeiro descobridor do caminho marítimo para a terra das especiarias, quando em 1487/8, ao dobrar o Cabo das Tormentas, ou da Boa Esperança, no extremo sul do continente africano, se tornou no primeiro europeu a conseguir esse feito, sendo também o primeiro europeu a navegar no Oceano Índico, provando assim a intercomunicabilidade desse oceano com o Atlântico.

Em fins de Agosto de 1487, D. João II, no seu afã de atingir a Índia e estabelecer relações com o Preste João, o mítico rei cristão oriental, enviou, com esse fim, uma frota composta por duas naus e uma naveta com mantimentos sobressalentes (para os navegadores não terem de voltar para trás por falta de mantimentos), sob o comando de Bartolomeu Dias, cavaleiro da sua casa e já navegador experimentado na costa africana.

A nau de comando, a S. Cristovão, era portanto, chefiada por Bartolomeu Dias, tendo como piloto Pero de Alenquer (nomeado depois piloto da nau de Vasco da Gama), um veterano nestas lides, a 2ª nau, a S. Pantaleão, foi confiada a João Infante, tendo como piloto Álvaro Martins e a naveta, a Diogo Dias, irmão de Bartolomeu, tendo como piloto João de Santiago.

Descendo ao longo da costa africana, ao sul do equador, iam nela colocando padrões, mas não só…A bordo seguiam 6 escravos, dois negros do Congo e quatro negras da costa da Guiné, já com instruções precisas do que deveriam fazer e que iriam ser desembarcados, um por um, em vários pontos dessa mesma costa. Diz o cronista João de Barros:

“…A causa de el-rei mandar lançar esta gente por toda aquela costa, vestidos e bem tratados, com mostra de prata, oiro e especiarias, era para que, indo ter a povoado, pudessem notificar de uns em outros a grandeza do seu reino, e as cousas que nela havia, e como por toda aquela costa andavam seus navios; e que mandava descobrir a Índia e principalmente um príncipe que se chamava Preste João, o qual lhe diziam que habitava naquela terra: tudo a fim que pudesse ir ter esta fama ao Preste, e fosse azo para ele mandar de lá de dentro, de onde habitasse, a esta costa do mar. Porque para todas estas cousas os negros e as negras, que, como não eram naturais da terra, ficavam com a esperança de tornarem os navios por ali, e as trazerem para este reino. Que entretanto elas entrassem pelo sertão, e aos moradores notificassem estas cousas, e aprendessem muito bem as que pudessem saber das que lhes eram encomendadas; e que podiam ficar seguras, porque, como eram mulheres, com quem os homens não têm guerra, não lhes haviam de fazer mal algum.”

A primeira negra ficou na Angra dos Ilhéus, onde o navegador assentou o primeiro padrão, a segunda foi lançada na Angra das Voltas; a terceira morreu; a quarta seria deixada, no final da viagem, na Angra dos ilhéus de Santa Cruz, ao pé de duas nativas que andavam mariscando.

Na Angra das Voltas, (29º. S), foram assaltados por um temporal que os fez andar de capa treze dias por mares mais frios. Quando o mau tempo amainou, decidiram tomar o rumo de leste, cuidando que ainda corriam na linha norte-sul a fim de poderem encontrar terra, como até então. Navegaram assim uns poucos de dias, mas como nada encontrassem, rumaram ao norte, e vieram ter, na outra costa, a uma angra, a que deram o nome “dos Vaqueiros”, por nela terem visto muitas vacas guardadas pelos seus pastores. Ao vê-los, os negros retiraram o gado para dentro…