“D. Joana, pela
graça de Deus, rainha de Castela, de Leão, de Portugal, de Toledo, de Sevilha,
de Córdova, de Múrcia, de Jaén, do Algarve, de Algeciras, de Gibraltar, Senhora
de Viscaya e de Molina”.
Contando com o
apoio dos nobres castelhanos partidários de Joana, e com promessas de auxílio
de Luís XI, rei de França, D. Afonso V entra em Castela com o seu exército,
tendo-se entretanto efectuado o casamento por procuração no Castelo de
Trujillo, pertencente ao marquês de Vilhena, tutor da infanta. Findo este, foi
a princesa conduzida a Palência, em cuja catedral se celebrou solenemente o matrimónio
e onde pela primeira vez D. Joana, com apenas 13 anos de idade, se encontrou
com o seu tio e marido, 40 anos mais velho…
Embora D. Afonso
V se tenha casado com a sobrinha ao abrigo de uma dispensa papal expedida por
Pio II, que lhe permitia fazê-lo “com mulher livre, solteira e não raptada”, e
legitimando os filhos que viessem a nascer, imediatamente se enviou um pedido
ao papa Sisto IV, para que fosse passada outra mais específica, dados os laços
de consanguinidade que uniam os nubentes.
Apesar de o
matrimónio não poder ser consumado devido à pouca idade da noiva, procedeu-se à
entronização dos cônjuges como Reis de Castela e Leão, após o que os seus adversários,
Isabel e Fernando de Aragão, se passaram a intitular Reis de Portugal.
Com Castela
dividida entre duas rainhas, uma apoiada por Aragão e a outra auxiliada por
Portugal, depressa se chegou ao confronto armado. Em 1476, a batalha de Toro,
perto de Zamora, pôs fim às ilusões de Joana…D. Afonso V, apesar de ter jurado
nunca a retirar dos seus reinos, prometendo-lhe conquistá-los e pacificá-los, entendeu
por bem abandonar Castela e regressar a Portugal com a sua jovem mulher para
preparar uma nova invasão.
A nova rainha de
Portugal é escoltada até Abrantes pelo príncipe D. João, onde fica
completamente afastada da corte e do rei, que entretanto se deslocara a França
em busca de auxílio militar, tanto de Luís XI como do duque da Borgonha, Carlos
o Temerário, filho de sua tia Isabel, assim como da intercessão destes junto do
papa para que a bula requerida para a consumação do matrimónio fosse expedida.
Mas o caracter fraco e indeciso do rei de Portugal assim como a sua boa-fé
foram aproveitados pelo monarca francês para se livrar do seu principal
inimigo, o duque da Borgonha, assinando depois um acordo com Isabel e Fernando
de Aragão, retirando o seu apoio ao rei português.
Por sua vez
Sisto IV, pressionado pelos reis castelhanos, não envia a bula requerida, e o
monarca português, velho, gasto e cansado, resolve abdicar do trono, mandando
que seu filho seja o rei, partindo para Jerusalém com a intenção de consagrar a
sua vida a Deus!
E a jovem D. Joana?
Duas vezes rainha, por nascimento e por matrimónio, esbulhada do seu reino de
Castela ao qual nunca mais voltaria, a sua situação em Portugal era bastante
incómoda. Rainha consorte ainda à espera da legitimação e consumação do
matrimónio, afastada de uma corte que não a queria, abandonada pelo marido
vivia em Aveiro junto de sua prima e enteada, também chamada Joana, à espera
que o seu destino se decidisse…
E a sua sorte
não melhorou com o regresso de D. Afonso V ao reino. Instado pelo filho aceitou
de novo a coroa, mas deixou que se entabulassem conversações com Castela tendo
em vista a reconciliação entre os dois reinos e o que fazer de D. Joana. Por
Portugal, foi a infanta D. Beatriz, cunhada do rei português e tia da jovem
rainha que conduziu as negociações junto da representante de Castela, a outra
tia da infanta, a própria rainha D. Isabel.
O Tratado de Alcáçovas,
também chamado de Alcáçovas-Toledo, ou Paz das Alcáçovas assinado a 4 de
Setembro de 1479, ratificado pelo rei de Portugal em Setembro do mesmo ano e
pelos futuros Reis Católicos em Março de 1489, em Toledo, seguido das chamadas “Tercerias
de Moura”, de que falaremos a seguir, põe fim a todas as ilusões que a infeliz
D. Joana pudesse albergar…
Depois de pedida
a anulação do seu casamento, sacrificada pela própria família aos interesses de
Estado, prefere aceitar a entrada num convento do que sujeitar-se às
humilhações que os tratados lhe impõem…