sábado, 11 de julho de 2015

Magna Carta IV



Após a morte do rei Ricardo,que não deixou descendência, sobe ao trono o seu irmão mais novo, João Sem-Terra, coroado como João I, de Inglaterra.
Embora no início do seu reinado procurasse reorganizar as finanças do país, a sua natureza violenta e cruel, a arrogância e o desprezo com que tratava os nobres – irlandeses, ingleses e normandos – e a impopularidade que já o acompanhava, depressa o tornaram odiado pela maior parte dos seus súbditos.
Uma má estratégia política e militar resultou na perda da quase totalidade das suas possessões no norte da França em 1204 e uma última tentativa em 1214 para recuperar o ducado da Normandia resultou num fracasso total. Em 1211 entrou também em conflito com o Papa Inocêncio III ao recusar-se aceitar o candidato nomeado por este para Arcebispo da Cantuária e ao confiscar os bens eclesiásticos, o que lhe valeu a excomunhão.
As desastrosas campanhas militares exigiam cada vez mais dinheiro e se em 1207, o rei controlava a sexta parte de todo o dinheiro em circulação no país, por volta de 1213 era já a metade desse todo que a Coroa arrecadava, o que não impedia que estivesse arruinada e o reino a braços com uma forte recessão económica.
Aproveitando-se desta debilidade interna, os barões do Norte (os chamados Northeners), ainda não esquecidos do poder que tinham adquirido durante o período da Anarquia revoltaram-se, pelo que por volta de 1212 o país encontrava-se num quase estado de guerra civil.
O humilhante desfecho do conflito que pôs frente a frente o monarca inglês e o autoritário Papa acabou por levar ao rubro a cólera de todos os ingleses. Além da excomunhão, Inocêncio III ameaçou destronar João I e dar a coroa ao seu rival, o rei Filipe Augusto, de França, que preparava uma expedição para invadir a Inglaterra. Perdendo toda a coragem, o rei ajoelhou-se em frente ao legado do Papa e estendeu-lhe a coroa, o que significava que aceitava a Inglaterra como um feudo do sumo pontífice, prometendo também pagar um tributo anual a Roma.
Em 1215, os vassalos romperam o juramento de fidelidade ao rei apoiados pelos burgueses de Londres e outras cidades seguiram-lhe o exemplo, tais como Bury, St. Edmunds e St. Albans, conhecidas como Charter Towns (as cidades da Carta). Liderados pelo Arcebispo da Cantuária, Stephen Langton, apresentaram ao rei, a 10 de Junho de 1215, um documento de 63 cláusulas, a que então se deu o nome de “Artigos dos Barões” (Articles of the Barons), e que foi assinado por ambas as partes a 19 desse mesmo mês, sendo enviadas cópias para as cidades mais importantes do país, existindo hoje apenas quatro delas.
A cláusula 61, a que os historiadores conhecem como “cláusula de segurança” e que estipulava a criação de uma comissão de 25 barões encarregada de vigiar a aplicação da Magna Carta, pressupunha uma humilhação inaceitável para qualquer governante, pois tornava-o formalmente num refém dos seus próprios súbditos.
Imediatamente depois de ser assinada, a Carta foi praticamente ignorada por ambas as partes; os barões não levantaram o cerco a Londres e o rei apelou para o Papa, que excomungou tanto o Arcebispo como os revoltosos, declarando que o documento “era nulo e vazio de qualquer conteúdo”, o que levou ao começo da Primeira Guerra dos Barões que durou de 1215 a 1216, altura da morte de João I.

Para os seus contemporâneos a Magna Carta foi um fracasso, com aplicação problemática uma vez que nenhuma das partes tinha a intenção de cumprir o acordado. Mas os compromissos que continha foram retomados nas décadas seguintes e, com algumas alterações, acabou por ser integrada na legislação inglesa.
Curiosamente, embora as cláusulas da Magna Carta na sua grande maioria tenham sido anuladas ao longo do tempo, substituídas ou simplesmente tornadas irrelevantes, 800 anos depois três delas - sobre a liberdade da igreja de Inglaterra, sobre as liberdades da cidade de Londres e sobre a recusa da privação de liberdade de forma arbitrária - continuam em vigor na lei inglesa, provando a imortalidade e invulgar atualidade de um dos mais importantes documentos da história universal.




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