O que é a Saudade?
Saudade é quando o momento tenta fugir da
lembrança para acontecer de novo e não consegue. Adriana Falcão.
"O tempo não pára, só a saudade é que faz as coisas pararem no
tempo."
Mário Quintana.
"Saudade é amar um passado que
ainda não passou. É recusar o presente que nos magoa. É não ver o futuro que
nos convida..."
Pablo Neruda
"A saudade é a memória do coração." Coelho Neto
"A saudade diminuiu ou fomos nós que envelhecemos?" Millôr Fernandes
Definição de Saudade
Saudade é
uma das palavras mais presentes na poesia de amor da língua portuguesa e também na música popular.
"Saudade", só conhecida em galego e português,
descreve a mistura dos sentimentos de perda, falta, distância e amor. A palavra
vem do latim
"solitas, solitatis"
(solidão), na forma arcaica de "soedade,
soidade e suidade" e sob influência de "saúde" e "saudar".
Em Portugal, o Fado, oriundo do latim "fatum", destino, está
directamente associado com este sentimento. Do mesmo modo, a sodade cabo-verdiana
está intimamente ligada ao género musical da morna. No Brasil, esse
sentimento está muito retratado no samba de fossa e na bossa nova.
Diz a lenda que o termo foi cunhado na
época dos Descobrimentos portugueses e do Brasil
colônia, quando esteve muito presente para definir a solidão dos
portugueses numa terra estranha, longe de entes queridos. Define, pois, a melancolia
causada pela lembrança; a mágoa que se sente pela ausência ou desaparecimento
de pessoas, coisas, estados ou ações. Provém do latim "solitáte", solidão.
Uma visão mais especifista aponta que o
termo saudade advém de solitude e saudar, onde quem sofre é o que fica a
esperar o retorno de quem partiu, e não o indivíduo que se foi, o qual sentiria
nostalgia. A génese do vocábulo está directamente ligada à tradição marítima
lusitana.
Na formação do termo "saudade", o vocábulo
sofreu uma interfluência entre o estado de estar só, sentir-se solitário -
oriundo de "solitarius"
que por sua vez advem de "solitas,
solitatis", possuidora da forma declinada "solitate" e suas variações luso-arcaicas como suidade
- e a associação com o acto de receber e acalentar este sentimento traduzido
com os termos oriundos de "salute
e salutare", que na transição do latim para o português sofrem uma
síncope e perde a letra interna l,
simplesmente abandonada, enquanto o t
não desaparece, mas passa a ser sonorizado como um d.
Recentemente, uma pesquisa entre tradutores
britânicos apontou a palavra "saudade" como a sétima
palavra de mais difícil tradução.
A Saudade, através dos tempos –
poetas e pintores
Amor cortês |
SAUDADE
Breve será vencedora
A morte com tal paixão,
Se não estancas coração
Esta dor que me devora.
Ausente minha senhora
Mil cuidados me dão guerra,
Não logro paz cá na terra.
E o sono, que invoco em vão,
Com a sua doce mão
Nunca as pálpebras me cerra.
AL-MUT’AMID, (1040-1095)
Que soydade de mha
senhor ey
Que soydade de
mha senhor ey,
Quando me nembra
d’ela qual a vi
E que me nembra
que bem a oy
Falar, e, por
quanto bem déla sey,
Rogu’eu a Deus,
que end’á o poder,
Que mh-a leixe,
si lhi prouguer, veer
Cedo,
ca, pero mi nunca fez bem,
Se
a non vir, non me posso guardar
Dénsandecer
ou morrer com pesar,
E,
por que ela tod’ en poder tem,
Rogu’
eu a Deus, que end’á poder
Que
mh-a leixe, si lhi prouguer, veer
Cedo,
ca tal a fez Nostro Senhor;
De
quantas outras € no mundo son
Non
lhi fez par a la minha fé, non,
E,
poy-la fez das melhores, melhor,
Rogu’eu
a Deus, que end’á o poder,
Que
mh-a leixe, si lhi prouguer, ver
Cedo,
ca tal quis (o) Deus fazer
Que,
se a non vyr, non posso viver.
D. Dinis, (1261-1325)
(C.V. 119, C.B.N. 526)
Que me quereis, perpétuas saudades?
Que me quereis, perpétuas saudades?
Com que esperança inda me enganais?
Que o tempo que se vai não torna mais,
E se torna, não tornam as idades.
Razão é já, ó anos, que vos vades,
Porque estes tão ligeiros que passais,
Nem todos pera um gosto são iguais,
Nem sempre são conformes as vontades.
Aquilo a que já quis é tão mudado,
Que quase é outra cousa, porque os dias
Têm o primeiro gosto já danado.
Esperanças de novas alegrias
Não mas deixa a Fortuna e o Tempo errado,
Que do contentamento são espias.
Luís de Camões, (1524-1580)
Edouard Hamman |
Estes Sítios!
Olha
bem estes sítios queridos,
Vê-os bem neste olhar derradeiro...
Ai! o negro dos montes erguidos,
Ai! o verde do triste pinheiro!
Que saudade que deles teremos...
Que saudade! ai, amor, que saudade!
Pois não sentes, neste ar que bebemos,
No acre cheiro da agreste ramagem,
Estar-se alma a tragar liberdade
E a crescer de inocência e vigor!
Oh! aqui, aqui só se engrinalda
Da pureza da rosa selvagem,
E contente aqui só vive Amor.
O ar queimado das salas lhe escalda
De suas asas o níveo candor,
E na frente arrugada lhe cresta
A inocência infantil do pudor.
E oh! deixar tais delícias como esta!
E trocar este céu de ventura
Pelo inferno da escrava cidade!
Vender alma e razão à impostura,
Ir saudar a mentira em sua corte,
Ajoelhar em seu trono à vaidade,
Ter de rir nas angústias da morte,
Chamar vida ao terror da verdade...
Ai! não, não... nossa vida acabou,
Nossa vida aqui toda ficou
Diz-lhe adeus neste olhar derradeiro,
Dize à sombra dos montes erguidos,
Dize-o ao verde do triste pinheiro,
Dize-o a todos os sítios queridos
Desta rude, feroz soledade,
Paraíso onde livres vivemos,
Oh! saudades que dele teremos,
Que saudade! ai, amor, que saudade!
Almeida Garrett, (1799-1854) in 'Folhas Caídas'
Vê-os bem neste olhar derradeiro...
Ai! o negro dos montes erguidos,
Ai! o verde do triste pinheiro!
Que saudade que deles teremos...
Que saudade! ai, amor, que saudade!
Pois não sentes, neste ar que bebemos,
No acre cheiro da agreste ramagem,
Estar-se alma a tragar liberdade
E a crescer de inocência e vigor!
Oh! aqui, aqui só se engrinalda
Da pureza da rosa selvagem,
E contente aqui só vive Amor.
O ar queimado das salas lhe escalda
De suas asas o níveo candor,
E na frente arrugada lhe cresta
A inocência infantil do pudor.
E oh! deixar tais delícias como esta!
E trocar este céu de ventura
Pelo inferno da escrava cidade!
Vender alma e razão à impostura,
Ir saudar a mentira em sua corte,
Ajoelhar em seu trono à vaidade,
Ter de rir nas angústias da morte,
Chamar vida ao terror da verdade...
Ai! não, não... nossa vida acabou,
Nossa vida aqui toda ficou
Diz-lhe adeus neste olhar derradeiro,
Dize à sombra dos montes erguidos,
Dize-o ao verde do triste pinheiro,
Dize-o a todos os sítios queridos
Desta rude, feroz soledade,
Paraíso onde livres vivemos,
Oh! saudades que dele teremos,
Que saudade! ai, amor, que saudade!
Almeida Garrett, (1799-1854) in 'Folhas Caídas'
MEUS OITO ANOS
Oh! Que
saudades que tenho
Da aurora
da minha vida,
Da minha
infância querida
Que os
anos não trazem mais!
Que amor,
que sonhos, que flores,
Naquelas
tardes fagueiras
À sombra
das bananeiras,
Debaixo
dos laranjais!
Como são
belos os dias
Do
despontar da existência!
— Respira
a alma inocência
Como
perfumes a flor;
O mar é —
lago sereno,
O céu — um
manto azulado,
O mundo —
um sonho dourado,
A vida —
um hino d’amor!
Que
aurora, que sol, que vida,
Que noites
de melodia
Naquela
doce alegria,
Naquele
ingênuo folgar!
O céu
bordado d’estrelas,
A terra de
aromas cheia
As ondas
beijando a areia
E a lua
beijando o mar!
Oh! Dias
da minha infância!
Oh! Meu
céu de primavera!
Que doce a
vida não era
Nessa
risonha manhã!
Em vez das
mágoas de agora,
Eu tinha
nessas delícias
De minha
mãe as carícias
E beijos
de minha irmã!
Livre
filho das montanhas,
Eu ia bem
satisfeito,
Da camisa
aberta o peito,
— Pés
descalços, braços nus
— Correndo
pelas campinas
A roda das
cachoeiras,
Atrás das
asas ligeiras
Das
borboletas azuis!
Naqueles
tempos ditosos
Ia colher
as pitangas,
Trepava a
tirar as mangas,
Brincava à
beira do mar;
Rezava às
Ave-Marias,
Achava o
céu sempre lindo.
Adormecia
sorrindo
E
despertava a cantar!
................................
Oh! Que
saudades que tenho
Da aurora
da minha vida,
Da minha
infância querida
Que os
anos não trazem mais!
— Que
amor, que sonhos, que flores,
Naquelas
tardes fagueiras
À sombra
das bananeiras
Debaixo
dos laranjais!
Casimiro de Abreu,
(1839-1860)
Almeida Júnior |
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