quarta-feira, 29 de maio de 2013

A Queda de Constantinopla – II

Constantino XI


A Batalha Final


No silêncio sepulcral que a seguir reinou nos dois lados, milhares de pessoas ao abrigo das muralhas milenares, esperavam angustiadas pelo dia e pela morte.
E de repente cem mil tomruks começaram a tocar e o canhão, o Basilisco, rugiu. Uma só vez. Era uma hora da manhã...Mehmed II tinha dado a ordem de ataque.
Num ápice, 50.000 homens precipitam-se para as muralhas, munidos de escadas, cabos e arpéus, correndo na escuridão, sabendo que não poderão recuar pois atrás de si levam uma fileira de janízaros com ordem para matar os que tentassem escapar. Eram simples basibozuks, andrajosos, desprotegidos, mercenários de várias nacionalidades misturados com escravos cristãos que os Turcos lançavam para minar as forças dos sitiados. Por duas vezes as suas vagas se lançaram ao assalto e por duas vezes foram repelidas.
Após duas horas de luta avançam os guerreiros da Anatólia, uma força de cavalaria disciplinada e bem equipada, envolvidos por brilhantes capas de seda e protegidos com couraças, seguidos por corpos de infantaria, tropas fisicamente bem retemperadas, ao contrário dos sitiados que combatendo ininterruptamente com as armaduras completas vestidas, saltando sem cessar de uma posição de ataque para outra, se encontram quase esgotados pelo cansaço. Mesmo assim, galvanizados na luta pela sobrevivência, repelem novamente todos os assaltos.
Nestas horas de agonia, os defensores já tinham perdido centenas de homens, muitos lutavam feridos e não poderiam aguentar-se muito mais tempo.
Mehmed II sabia-o e não pretende dar-lhes descanso algum. Vendo goradas todas as suas investidas, manda avançar a sua força de escol, 12.000 janízaros, soldados seleccionados do melhor que a Europa conhece, e comandando-os pessoalmente lança-os a uma só voz contra o adversário exausto.
Conhecidos pela sua crueldade implacável, os janízaros nunca fugiam. Quando um deles caía, logo o seu posto era tomado por outro. Cobertos com os gorros turcos, altos chapéus de pano e pele, fortemente armados, investiram de sabre na mão, levando consigo centenas de arcabuzes.
Dentro das muralhas, os combatentes souberam que o pior de todo aquele pesadelo tinha começado. Todos os sinos das igrejas repicam chamando às muralhas todos os que ainda se encontram em estado de lutar, incluindo os marinheiros que estavam nas naus. Homens, mulheres e inclusive crianças, correm a reforçar as brechas abertas nas muralhas constantemente flageladas pelos tiros dos canhões.
Mas nem os janízaros conseguem ascender às muralhas. No fragor da luta, um tiro de arcabuz atinge o líder do exército genovês, o Condottiere Giustiniani, que é levado para a sua embarcação ancorada no Corno de Ouro com ferimentos graves; a sua baixa faz vacilar o moral dos combatentes. O Imperador, que defendia o lado sul, acorre a tomar conta da situação e o ataque é mais uma vez rechaçado. O sultão, mesmo expondo-se às balas, grita aos seus homens que continuem a lutar, cobrirá de ouro o primeiro que subir às ameias e concentra o ataque na torre de San Romano, desfalcada pela saída dos genoveses e por cujas brechas os janízaros se começam a infiltrar.
Constantino XI defendia as muralhas que davam para o Vale do Lico, debaixo da enorme pressão dos invasores turcos. Um grupo deles, infiltrando-se pelas brechas da primeira muralha descobriu, aberta, uma das pequenas portas que guarneciam a muralha interior da cidade, a chamada Kerkaporta, que por um incompreensível descuido os sitiados se tinham esquecido de fechar. Embora não tivesse qualquer valor militar, esta porta assim aberta dava acesso franco ao coração da cidade, enquanto em cada brecha, em cada buraco, se amontoavam corpos aos milhares e se lançava das ameias óleo fervente sobre os atacantes.
Milhares de soldados irrompem pela Kerkaporta apanhando os defensores das muralhas completamente desprevenidos. Constantino sabe que a Cidade está perdida e recusando todos os pedidos para se pôr a salvo, atira-se de gládio na mão, juntamente com um punhado dos seus fiéis para o mais aceso da batalha não querendo sobreviver ao seu império…
Quando os Bizantinos se aperceberam da presença dos Turcos dentro da cidade, entraram em pânico. Multidões aterradas dirigiram-se para os portos tentando entrar nas embarcações aí ancoradas, outros procuravam fugir para o interior das terras. Um grande número deles procurou asilo dentro da catedral, pensando que o seu caracter sagrado os pouparia a uma morte violenta.
Mas nas ruas a chacina e o saque tinham começado. Fiel à sua palavra, Mehmed II entregou a “Nova Roma” aos seus soldados reservando para si a glória de a ter conquistado, o que lhe valeu o cognome de Il Fatih (O Conquistador).
Ao fim de três dias a “Rainha das Cidades” não passava de um montão de ruínas. Entrando a cavalo na manhã do quarto-dia, o sultão dirigiu-se à Catedral de Santa Sofia e recitou do altar-mor a prece muçulmana da quarta-feira. Em seguida os operários abateram o altar, cobriram com cal os belos mosaicos que lhe cobriam as paredes e a cruz que encimava a cúpula foi quebrada sendo substituída pelo crescente.
A mais bela igreja da cristandade tornara-se numa mesquita. O Império Bizantino deixara de existir e Constantinopla passou a chamar-se Istambul.
Tal como o grão de areia da história, Kerkaporta, a porta esquecida, foi decisiva para a História Universal.

 

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