Constantino XI |
A Batalha Final
No silêncio sepulcral
que a seguir reinou nos dois lados, milhares de pessoas ao abrigo das muralhas
milenares, esperavam angustiadas pelo dia e pela morte.
E de repente cem
mil tomruks começaram a tocar e o canhão, o Basilisco, rugiu. Uma só vez. Era
uma hora da manhã...Mehmed II tinha dado a ordem de ataque.
Num ápice, 50.000
homens precipitam-se para as muralhas, munidos de escadas, cabos e arpéus,
correndo na escuridão, sabendo que não poderão recuar pois atrás de si levam
uma fileira de janízaros com ordem para matar os que tentassem escapar. Eram simples
basibozuks, andrajosos, desprotegidos, mercenários de várias nacionalidades misturados
com escravos cristãos que os Turcos lançavam para minar as forças dos sitiados.
Por duas vezes as suas vagas se lançaram ao assalto e por duas vezes foram
repelidas.
Após duas horas
de luta avançam os guerreiros da Anatólia, uma força de cavalaria disciplinada
e bem equipada, envolvidos por brilhantes capas de seda e protegidos com
couraças, seguidos por corpos de infantaria, tropas fisicamente bem retemperadas,
ao contrário dos sitiados que combatendo ininterruptamente com as armaduras
completas vestidas, saltando sem cessar de uma posição de ataque para outra, se
encontram quase esgotados pelo cansaço. Mesmo assim, galvanizados na luta pela
sobrevivência, repelem novamente todos os assaltos.
Nestas horas de
agonia, os defensores já tinham perdido centenas de homens, muitos lutavam
feridos e não poderiam aguentar-se muito mais tempo.
Mehmed II sabia-o
e não pretende dar-lhes descanso algum. Vendo goradas todas as suas investidas,
manda avançar a sua força de escol, 12.000 janízaros, soldados seleccionados do
melhor que a Europa conhece, e comandando-os pessoalmente lança-os a uma só voz
contra o adversário exausto.
Conhecidos pela sua
crueldade implacável, os janízaros nunca fugiam. Quando um deles caía, logo o
seu posto era tomado por outro. Cobertos com os gorros turcos, altos chapéus de
pano e pele, fortemente armados, investiram de sabre na mão, levando consigo
centenas de arcabuzes.
Dentro das
muralhas, os combatentes souberam que o pior de todo aquele pesadelo tinha
começado. Todos os sinos das igrejas repicam chamando às muralhas todos os que
ainda se encontram em estado de lutar, incluindo os marinheiros que estavam nas
naus. Homens, mulheres e inclusive crianças, correm a reforçar as brechas
abertas nas muralhas constantemente flageladas pelos tiros dos canhões.
Mas nem os
janízaros conseguem ascender às muralhas. No fragor da luta, um tiro de arcabuz
atinge o líder do exército genovês, o Condottiere Giustiniani, que é levado
para a sua embarcação ancorada no Corno de Ouro com ferimentos graves; a sua
baixa faz vacilar o moral dos combatentes. O Imperador, que defendia o lado sul,
acorre a tomar conta da situação e o ataque é mais uma vez rechaçado. O sultão,
mesmo expondo-se às balas, grita aos seus homens que continuem a lutar, cobrirá
de ouro o primeiro que subir às ameias e concentra o ataque na torre de San
Romano, desfalcada pela saída dos genoveses e por cujas brechas os janízaros se
começam a infiltrar.
Constantino XI
defendia as muralhas que davam para o Vale do Lico, debaixo da enorme pressão
dos invasores turcos. Um grupo deles, infiltrando-se pelas brechas da primeira
muralha descobriu, aberta, uma das pequenas portas que guarneciam a muralha
interior da cidade, a chamada Kerkaporta, que por um incompreensível descuido
os sitiados se tinham esquecido de fechar. Embora não tivesse qualquer valor
militar, esta porta assim aberta dava acesso franco ao coração da cidade,
enquanto em cada brecha, em cada buraco, se amontoavam corpos aos milhares e se
lançava das ameias óleo fervente sobre os atacantes.
Milhares de
soldados irrompem pela Kerkaporta apanhando os defensores das muralhas
completamente desprevenidos. Constantino sabe que a Cidade está perdida e
recusando todos os pedidos para se pôr a salvo, atira-se de gládio na mão,
juntamente com um punhado dos seus fiéis para o mais aceso da batalha não
querendo sobreviver ao seu império…
Quando os Bizantinos
se aperceberam da presença dos Turcos dentro da cidade, entraram em pânico. Multidões
aterradas dirigiram-se para os portos tentando entrar nas embarcações aí
ancoradas, outros procuravam fugir para o interior das terras. Um grande número
deles procurou asilo dentro da catedral, pensando que o seu caracter sagrado os
pouparia a uma morte violenta.
Mas nas ruas a
chacina e o saque tinham começado. Fiel à sua palavra, Mehmed II entregou a “Nova
Roma” aos seus soldados reservando para si a glória de a ter conquistado, o que
lhe valeu o cognome de Il Fatih (O Conquistador).
Ao fim de três
dias a “Rainha das Cidades” não passava de um montão de ruínas. Entrando a
cavalo na manhã do quarto-dia, o sultão dirigiu-se à Catedral de Santa Sofia e
recitou do altar-mor a prece muçulmana da quarta-feira. Em seguida os operários
abateram o altar, cobriram com cal os belos mosaicos que lhe cobriam as paredes
e a cruz que encimava a cúpula foi quebrada sendo substituída pelo crescente.
A mais bela
igreja da cristandade tornara-se numa mesquita. O Império Bizantino deixara de
existir e Constantinopla passou a chamar-se Istambul.
Tal como o grão
de areia da história, Kerkaporta, a porta esquecida, foi decisiva para a
História Universal.
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