domingo, 22 de maio de 2011

Malfadados Amores


No parque que fica à retaguarda do que é hoje denominado por Templo da Kun Iâm, a Deusa da Misericórdia, em Macau, existem duas árvores com os troncos estranhamente enlaçados um no outro, atraindo a curiosidade dos visitantes.
Conta a lenda, que, ainda antes de o templo ser edificado, aquele sítio era um povoado chamado Móng Há, habitado por agricultores. Ora, vivia aí um lavrador, que embora não fosse rico, tinha mais bens que os outros, sendo respeitado por todos, por ser uma pessoa ponderada e cordial vivendo com moderação. Chamavam-lhe Lou Uóng (velho Uóng) e era pai de uma bonita rapariga chamada A Kâm, que estava em idade de casar. Embora tivesse vários pretendentes, Lou Uóng tinha-os recusado a todos, egoisticamente, porque se a deixasse ir embora, não teria ninguém que o ajudasse no trabalho da lavoura.
Ora acontece, que pai e filha eram ajudados nos trabalhos da monda por dois moços da lavoura, um dos quais, A Heng, era um moço simpático, muito alegre e bastante trabalhador. Sempre que podia, ajudava A Kâm aliviando-a do trabalho mais pesado, e a simpatia recíproca depressa se transformou em amor…
Ao sentir-se grávida, A Kâm muito a medo, revelou ao pai o seu estado, pedindo-lhe que a deixasse casar com A Heng. Furioso, Lou Uóng mandou chamar o rapaz, insultou-o e declarou que nunca lhe daria a filha em casamento por ele ser alguém sem eira nem beira. O melhor que ele tinha a fazer era pôr termo à vida, para não ter de ser sempre um miserável e desprezível trabalhador.
A Heng amava sinceramente a filha do lavrador e vendo que nunca a conseguiria, procurou-a para lhe dizer que tencionava suicidar-se, pois preferia morrer a ter de desistir dela. A Kâm, que também o amava, disse-lhe que o acompanharia na morte, pois talvez noutro mundo conseguissem alcançar a felicidade que aqui lhes era negada.
Assim, quando o Sol se pôs na colina findando o dia de trabalho, os dois amantes dirigiram-se para as traseiras da capela da Kun Iâm e depois de se abraçarem, enforcaram-se nos ramos de duas árvores que cresciam isoladas naquele local.
Os espíritos dos dois suicidas nunca mais se aquietaram e a partir da meia-noite, os seus vultos viam-se a passear abraçados, soltando lamentos tão aflitivos, que os moradores não conseguiam dormir…e para espanto de todos, as duas árvores onde eles se enforcaram, cresceram com grande pujança, mas com os seus troncos abraçados um ao outro como se dois seres se tratassem envolvidos em forte amplexo, e com o aspecto estranho que mantêm até hoje!
Mais tarde, quando foram ali construídas várias capelas, o superior do mosteiro, ouvindo a história daqueles amores, celebrou diversas cerimónias para libertar aquelas almas atormentadas. Só assim é que os moradores de Móng Há puderam voltar a dormir descansados e os dois vultos nunca mais foram vistos, nem ouvidos…

Lenda contada por Luís Gonzaga Gomes no seu livro – Macau Factos e Lendas.
Imagem: infoescola.com

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