João XXI
Pedro Julião, mais conhecido como Pedro Hispano, nasceu em Lisboa, provavelmente na que é a actual freguesia de S. Julião, em data incerta, mas seguramente antes de 1226 e faleceu em Viterbo a 20 de Maio de 1277. O seu Papado decorreu de 20 de Setembro de 1276, até à data da sua morte, tendo sido também um famoso médico, professor e matemático do século XIII. Foi o único Papa médico e português. Era filho de Julião Rebelo, médico, cuja profissão segue, e de Teresa Gil (embora Ribeiro Soares defenda que possa ter sido filho do chanceler de D. Sancho I, Mestre Julião Pais).
Começou os seus estudos na escola episcopal da catedral de Lisboa, tendo mais tarde estudado na Universidade de Paris e também na Universidade de Montpellier, com mestres notáveis, como São Alberto Magno, e tendo por condiscípulos São Tomás de Aquino e São Boaventura, grandes nomes do cristianismo. Entre 1246 e 1252 ensinou medicina na Universidade de Siena, onde escreveu algumas obras, de entre as quais se destaca o Tratado Summulae Logicales, que foi o manual de referência sobre lógica aristotélica durante mais de trezentos anos, nas universidades europeias, com 260 edições em toda a Europa, traduzido para grego e hebraico. A quando da reforma da Universidade de Lisboa no reinado de D. Manuel I, esta obra ainda fazia parte do plano de estudos. Exerceu também clínica na leprosaria dessa cidade.
Prova da sua vastíssima cultura científica encontra-se na obra De Oculo, um tratado de Oftalmologia, que conhece ampla difusão nas universidades europeias, sendo citado por Arnaldo de Villanova e Guy de Chauliac, o mais famoso cirurgião da Idade Média, e serve de texto clínico por mais de dois séculos. Quando Miguel Ângelo adoece gravemente dos olhos, devido ao árduo labor consumido na decoração da Capela Sistina, encontra remédio numa receita de Pedro Julião. De sua autoria, é também o ‘Thesaurus Pauperum’ (Tesouro dos pobres), em que trata de várias doenças e suas curas, com cerca de uma centena de edições e traduzido para 12 línguas. É também autor da Scientia libri de anima e De tuenda valetudine, dedicada a Branca de Castela, esposa de Luís VIII de França e filha de Afonso IX, de Castela
Antes de 1261, ano em que é eleito decano da Sé de Lisboa, Pedro Julião ingressa no sacerdócio. O rei Afonso III de Portugal confia-lhe o priorado da Igreja de Santo André (Mafra) em 1263, posto o que é elevado a cónego e deão da Sé de Lisboa, Tesoureiro-mor na Sé do Porto e Dom Prior na Colegiada Real de Santa Maria de Guimarães.
Após a morte de Dom Martinho Geraldes, Pedro Julião é nomeado Arcebispo de Braga pelo Papa Gregório X, em 1273. Um ano depois, participa no XIV Concílio Ecuménico de Lião, altura em que Gregório X o eleva a Cardeal-bispo de Frascati, o que permite ao pontífice poder contar com os serviços médicos do sábio português. Regressa ao Arcebispado de Braga, até ser nomeado o sucessor, Dom Sancho. De volta á corte pontifícia, Gregório X nomeia-o seu médico principal em 1275.
A eleição de Pedro Julião, em conclave realizado em Viterbo, após a morte do Papa Adriano V, a 18 de Agosto de 1276, decorre num período muito perturbado por tensões políticas e religiosas e com alguns cardeais a sofrer violências físicas. A sua eleição foi uma surpresa, e terá sido consequência da guerra de influências entre duas famílias poderosas, os Orsini e os Collona. Pedro Hispano não era italiano e não pertencia a qualquer partido. Possuía, sim, uma cultura e um prestígio científico excepcionais, assim como a fama de homem recto, que acabaram por se sobrepor às guerrilhas políticas, e à pressão da população de Viterbo, que exigia a eleição papal sem mais delongas.
É eleito Papa a 13 de Setembro de 1276 e coroado7 dias depois, adoptando o nome de João XXI.
Irá marcar o seu breve pontificado (de pouco mais de 8 meses) pela fidelidade ao XIV Concílio Ecuménico de Lião, apressando-se a mandar castigar, em tribunal criado para o efeito, os que haviam molestado os cardeais presentes no conclave que o elegera.
Empenha-se na união entre os cristãos de Roma e os do Oriente, e recebe e retribui uma embaixada dos reis Tártaros, com quem procurou estabelecer relações de amizade, seguindo a política do seu antecessor. Intenta reconciliar as grandes nações europeias como a França, Alemanha e Castela, mas sem grande sucesso. Esforça-se também por preparar uma nova Cruzada a fim de se libertar Jerusalém, e em 1277, devido aos problemas do rei português D. Afonso III com o clero, ordena a sua excomunhão e que fosse lançado o interdito sobre o reino. Morre no entanto antes de ver a sua ordem cumprida.
É um homem dotado de grande simplicidade, recebendo em audiência tanto os ricos como os pobres. Dante Alighieri, poeta italiano (1265-1321), na sua famosa ‘Divina Comédia’, coloca a alma de João XXI no Paraíso, canto XII, junto com a de São Boaventura, apelidando-o de “aquele que brilha nos seus doze livros”, menção clara aos doze livros em que se divide o Tratado Summulae Logicales. Mecenas de artistas e estudantes, é tido na sua época por 'egrégio varão de letras', 'grande filósofo', 'clérigo universal' e 'completo cientista físico e naturalista'.
Mais dado ao estudo que às tarefas pontifícias, João XXI delega no Cardeal Orsini, o futuro Papa Nicolau III, os assuntos correntes da Sé Apostólica, e manda construir no seu palácio de Viterbo um gabinete, onde realizava as suas experiências, que para o inculto clero daquela época, pareciam bastante suspeitas. A 10 de Maio de 1277, um desmoronamento das paredes do seu aposento, fosse devido às obras aí decorrentes ou a uma explosão provocada por uma das suas experiências, provocam-lhe horríveis ferimentos a que sobrevive apenas 6 ou 10 dias, falecendo com apenas 51 ou 53 anos de idade. É sepultado junto do altar-mor da Catedral de São Lourenço, naquela cidade, mas no século XVI, durante os trabalhos de reconstrução do templo, os seus restos mortais são trasladados para modesto e ignorado túmulo. Através do contributo da Câmara Municipal de Lisboa, feito pelo Dr. João Soares então seu presidente, o mausoléu é colocado, a título definitivo, ao lado do Evangelho de Catedral de Viterbo, a 28 de Março de 2000.
Fontes: Wikipédia
Revista “Acção Médica”, Novembro de 2007
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