segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Caravaggio - II

Pormenor do quadro David com a cabeça de Golias, Auto-Retrato
Embora muitas das suas telas fossem recusadas, no final do século XVI tornara-se num dos pintores barrocos mais famosos de Roma e o seu estilo original era admirado por alguns dos patronos mais ricos e poderosos da Itália, que as compravam para as suas colecções particulares, como aconteceu com o seu quadro “A Morte da Virgem”.
Actualmente no Museu do Louvre, causou enorme escândalo quando Caravaggio a apresentou. Para a sua execução usou como modelo o cadáver de uma prostituta afogada, grávida e já com a pele esverdeada pelo tempo passado dentro de água. Os pés pendem para fora da cama e está vestida como uma mulher vulgar. Apenas o finíssimo halo dourado à volta da sua cabeça nos dá uma indicação de santidade. Tinha sido encomendado em 1601 para figurar no altar da igreja de Santa Maria della Scala e quando os padres, horrorizados, a viram recusaram-na de imediato. Foi mais tarde comprada pelo Duque de Mântua.
Em “A Ressurreição de Lázaro”, forçou os aterrorizados modelos a pegar num cadáver sob a ameaça de um punhal e diz-se também que o modelo para as suas “Madonas” era a sua amante, uma prostituta chamada Lena, por causa de quem infligiu ferimentos graves num notário, tendo de fugir para Génova.
A natureza-morta foi um dos seus géneros preferidos, dizendo ser necessária tanta habilidade para pintar flores, como para pintar figuras humanas.
A sua vida irregular, cheia de brigas, duelos e prisões, onde numa delas chega a ser açoitado, agrava-se quando em 1606 assassina um nobre durante um jogo de pellacorda, um antepassado do ténis. Preso novamente, foge para Nápoles onde pinta várias telas entre elas dois quadros sobre a Flagelação de Cristo, como se se referisse à sua própria experiência dolorosa em Roma. Segue depois para Malta, onde chega em Julho de 1607, contando com a protecção do Grão-Mestre da Ordem, Alof de Wignacourt, para quem pinta dois retratos e um quadro para a Igreja, “A Decapitação de S. João Baptista”.
Torna-se cavaleiro da Ordem, e fica em La Valetta cerca de cinco meses, pintando uma sucessão de obras sacras e profanas mas ao fim desse tempo, é preso novamente e expulso da Ordem, sendo classificado na acta de acusação como um membro “putridum et foetidum”. Com a ajuda de amigos consegue fugir novamente, desembarcando em Siracusa, onde fica pouco tempo. Dali segue para Messina e em finais de 1609 embarca para Nápoles. Está doente e envelhecido pelas muitas provações, mas continua a pintar. É descoberto pelos seus inimigos que o atacam e abandonam numa rua julgando-o morto, mas sobrevive, ficando desfigurado.
Entretanto, em Roma, os seus amigos tentam obter-lhe o perdão junto do Papa Paulo V. Antecipando-se a essa amnistia embarca numa falua para Porto Ercole, ocupado pelos espanhóis, e que está a um dia de viagem de Roma. Mal desembarca é preso e os seus poucos bens apreendidos. Depois de solto, apercebe-se que o barco tinha partido e, desesperado, deambulou pelas praias sob o sol escaldante de Verão até desmaiar de febre.
Morre a 18 de Julho de 1610, em Porto Ercole, na comuna do Monte Argentario, de malária e completamente na miséria. Quando o perdão finalmente chegou, era tarde de mais.
Num dos seus últimos quadros,” David com a cabeça de Golias”, auto-retrata-se na cabeça melancólica de Golias, expressando o desalento em que viveu os seus últimos anos, e talvez como premonição do seu próximo fim. A expressão de David demonstra compaixão e não triunfo como seria de esperar, ao olhar a cabeça cortada que segura na sua mão…
Foram precisos três séculos para que o esquecimento a que injustamente foi votado tivesse fim e fosse entusiasticamente redescoberto. Por volta de 1920 os trabalhos do crítico Robert Longhi trouxeram-no de novo ao conhecimento do público. Reconhecido como um dos “pais” da pintura moderna, as suas obras foram este ano expostas em várias Galerias de Arte para comemorar o quarto centenário da sua morte.
“No dia seguinte da Renascença, o que começa com Caravaggio, é simplesmente a pintura moderna”. André Berne-Joffroy.

A Morte da Virgem

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