terça-feira, 9 de novembro de 2010

O Terramoto de 1755 - II

Alegoria ao terramoto de 1755 pelo pintor João Glama Stroberle


Ironia ou premonição? Para aquele 1 de Novembro de 1755 estava anunciado um espectáculo na sumptuosa Real Casa da Ópera, cujo título era ” A Destruição de Tróia”!
Lisboa comemorava também neste ano o 500º aniversário da sua elevação a cidade, e possivelmente alguém se poderá ter lembrado duma velha profecia que falava de um grande desastre a acontecer num ano com dois 5.
Dos três abalos que se fizeram sentir, o 2º foi o mais forte e atingiu 8,75 ou 9 valores na escala de Richter, e foram o suficiente para que apenas em 15 minutos, a quarta maior cidade da Europa ficasse reduzida a ruínas. Morreram cerca de 50 a 60.000 pessoas (não se sabe ao certo o número exacto), e os prejuízos foram incalculáveis
Além dos abalos e do tsunami que provocaram, os incêndios lavraram durante uma semana, ajudando a destruir o que ainda resistisse.
A Casa da Ópera, inaugurada apenas seis meses antes, considerada a melhor da Europa, foi completamente destruída pelo fogo. O Palácio Real, que se situava onde hoje existe o Terreiro do Paço, também foi destruído e com ele perderam-se a biblioteca com cerca de 70 mil volumes, incluindo manuscritos raros e partituras musicais, assim como centenas de obras de arte, incluindo pinturas de Ticiano, Rubens e Correggio, ardendo também os Armazéns das especiarias e a Casa da Índia com todo o seu arquivo – manuscritos, cartas, mapas – que se foram avolumando ao longo dos 250 anos de comércio com o Oriente e também, segundo se pensa, mais de um milhão de libras em diamantes. A Casa dos Seguros, a Bolsa do Trigo, os estaleiros da Ribeira das Naus, assim como as centenas de armazéns e lojas ribeirinhas, desapareceram tragadas pelas chamas.
O terramoto destruiu ainda as maiores igrejas e conventos de Lisboa, como a Igreja de Sto. António, as Basílicas de São Paulo, Santa Catarina, S. Engrácia, São Vicente de Fora e a da Misericórdia, o Convento de S. Francisco, o da Boa Hora, as igrejas do Loreto, da Encarnação juntamente com os seus tesouros, entre outras, e fazendo ruir o pesado campanário da Sé Catedral. O Convento do Carmo cujas ruínas ainda miram altaneiras a nova baixa pombalina, ruiu, perdendo-se o túmulo do Santo Condestável, seu fundador. O Convento da Trindade, situado do outro lado, ruiu também ao mesmo tempo, e o estrondo foi tão grande que ainda hoje se usa a expressão “Caiu o Carmo e a Trindade”. Dos 65 que existiam, apenas 5 ficaram em condições de recolher sobreviventes. O Palácio da Inquisição e o Convento de S. Domingos com as suas duas bibliotecas de 10.000 livros e 5600 volumes de manuscritos raros arderam também
O Hospital Real de Todos os Santos ardeu de uma ponta a outra e com ele centenas de doentes que não puderam fugir. Alguns outros hospitais tiveram a mesma sorte, e na prisão do Limoeiro, a maior, cerca de 400 presos encontraram a morte. Gabinetes municipais com os seus livros de registos desaparecem e em muitas paróquias não havia nada de pé.
Cerca de 50 palácios de vários nobres, entre eles o dos duques de Bragança o maior da cidade, desapareceram juntamente com as suas bibliotecas, algumas valiosíssimas, como as do Conde da Ericeira, assim como objectos de arte, pratas … O embaixador de Espanha morre à saída do seu palácio quando se preparava para fugir, ao cair-lhe em cima o escudo de pedra que encimava o portal!
O arquivo da Torre do Tombo salvou-se, graças ao seu guarda-mor, engenheiro Manuel da Maia, que conseguiu fazer retirar todo o recheio do arquivo nacional da torre que ameaçava ruir e o colocou no centro da parada do castelo de S. Jorge, onde ficou resguardado até poder ser encaminhado para o Convento de São Bento da Saúde. A Casa dos Contos foi completamente destruída salvando-se apenas as arcas chapeadas de ferro “as burras”, que foram depois entregues na Casa da Moeda, onde apenas um oficial muito jovem montava guarda sozinho. Durante três dias, depois de todos os seus soldados desertarem, repeliu as chamas conforme elas avançavam, mantendo-se no seu posto, sem saber o que teria acontecido à sua família, conquistando assim o posto de capitão que a sua bravura merecera.
Muita gente vagueava pelas ruas, muitas delas seminuas, ou apenas em camisa, mas logo a seguir ao sismo uma onda de solidariedade varreu a cidade…Fidalgos, nobres, burgueses, o clero regular e secular saíram para tentar ajudar a retirar pessoas dos escombros e abriram as portas das suas casas para acomodar, alimentar e tratar todos os que necessitassem de auxílio…
Uma senhora de idade foi resgatada vários dias depois do terramoto ainda com vida e uma menina de três anos sobreviveu sete horas debaixo dos escombros, embora ferida com bastante gravidade na cabeça. O ex-voto que o pai agradecido dedicou a Nossa Senhora da Estrela diz assim:


A nossa Senhoª da Estrella
voto que no terremoto de 1755 fez
Leonardo Rodrigues; porque fal-
tando-lhe huma filha de 3 anos
invocando ajudª Santissima a achou depo-
es de 7 horas nas ruinas das su-
as cazas com huma tão perigosa
ferida na cabeça, que atribue a sua
vida à intercessão da Soberana
Senhora.





Fontes: Domingues, Mário – O Marquês de Pombal, ed. Romano Torres, 1955
Paice, Edward – A Ira de Deus, casa das letras, 2009
Wikipédia.org
Jornal de História, 43º fascículo
Museudacidade.pt

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