sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Mitologia vegetal


Quase todas as culturas antigas representavam a Terra e a Natureza como a grande Deusa-Mãe. Se pensarmos que a vida na terra depende das plantas e que directa ou indirectamente é a elas que vamos buscar alimentos, combustíveis, oxigénio, medicamentos, materiais de construção e uma série de outras coisas necessárias à nossa existência, não é de admirar que desde os primórdios da Humanidade, os seres humanos acreditassem que possuíam uma energia divina.
Representando o ciclo da vida (fertilidade, morte e renascimento), as suas flores são símbolos de juventude e vitalidade, mas também de fragilidade e transitoriedade. A sua forma em receptáculo torna-as essencialmente femininas e o seu desabrochar é por vezes associado ao parto. Noutras, a abertura da flor em botão representa a criação e a energia do sol, representando a natureza-morta pintada pelos artistas, a recordação da brevidade da vida.
As plantas sagradas podiam ser boas ou ruins, tanto podiam dar a vida como a morte. Na maioria das lendas sul-americanas as plantas importantes são feitas do sangue, ossos e carne de seres ancestrais, heróis míticos ou espíritos da floresta.
Os frutos tinham geralmente um forte simbolismo de fertilidade e eram muitas vezes associados às deusas da maternidade e do amor. A ingestão de um fruto tanto poderia representar o dom da imortalidade como o oposto. Adão e Eva foram expulsos do paraíso por comerem uma maçã…
Dentro deste reino vegetal, as árvores são um dos símbolos mais poderosos da humanidade. Formada por matéria lenhosa e aquosa, ela personifica a união dos três reinos (céu, terra e água) e os quatro elementos: as suas raízes mergulham na terra, a água em forma de seiva percorre-as, as suas folhas respiram o ar, e o tronco dá-nos o fogo. Embora considerada como símbolo maternal (madeira em latim é do género feminino e tem a mesma raiz comum à da mãe e à da matéria - mater), muitas delas são masculinas. No entanto, os significados atribuídos às árvores, pelas diferentes culturas são muitos e variados. As de folha persistente representam longevidade e imortalidade e as de folha caduca representam regeneração e renascimento. Umas possuíam poderes mágicos, outras possuíam o poder de curar. Tal como as plantas, umas são boas, outras nem tanto. Podiam também ser habitadas pelas divindades, fantasmas dos antepassados, ou espíritos, a quem se deviam fazer oferendas, sacrifícios e orações.
A imagem da árvore cósmica ou da vida faz parte dos mitos e contos de todos os povos, sendo algumas representadas invertidas. Este símbolo tão antigo aparece no cristianismo associado à Virgem Maria, que nos deu o seu fruto, Jesus. Maria aparece muitas vezes em árvores ou troncos ocos, e Jesus por sua vez é crucificado numa cruz feita com a madeira da árvore da ciência que brotou no paraíso, e que na tradição medieval, tinha raízes que chegavam ao inferno e cujo topo alcançava o céu.
As florestas e os bosques eram muitas vezes a morada de duendes, fadas, magos e feiticeiros, onde nalguns considerados sagrados, não se podia entrar, cortar madeira, nem caçar qualquer animal. Eram também o centro da vida religiosa e política dos povos germânicos, e na Lituânia, no sec. XI, os cristãos não se podiam aproximar dos bosques sagrados porque podiam contaminá-los.
Era à sombra das árvores que Buda meditava e os índios da América do Norte enterravam os seus mortos em troncos ocos, ou em caixas de madeira colocadas em cima de árvores.
A cor verde que ostentam é também sinónimo de vitalidade contínua, e a sua fecundidade fizeram com que se tornassem focos de antigos ritos de fertilidade. Os costumes populares em que as mulheres estéreis abraçavam certas arvores ou se deitavam por debaixo delas para engravidar são por demais conhecidos.
Com o passar dos tempos a linguagem dos símbolos foi-se perdendo e hoje, florestas inteiras desaparecem sob a mão impiedosa do Homem esquecido por completo do quanto lhes deve!

Fontes: Fontana. David – A linguagem dos símbolos
Lipp, Frank J. – O Simbolismo das Plantas
Espírito Santo, Moisés – A religião popular Portuguesa

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